Rubens Minelli, um dos maiores técnicos do futebol brasileiro, foi o meu entrevistado do dia 13 de Fevereiro de 2012. Obtive o seu contato através do meu amigo Matheus Trunk (Alltv). O grande treinador me concedeu uma bela entrevista, sendo que, da mesma forma que Mario Travaglini, mostrou todo o seu conhecimento sobre futebol.
FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Rubens Minelli, você nasceu no dia 19 de Dezembro de 1928. Seu pai, José Minelli, foi um ex-jogador de futebol, jogando na época do Artur Friedenreich. Ele comentava sobre o próprio Friedenreich e tantos outros jogadores desse tempo?
RUBENS MINELLI: Eu cheguei ainda a ver o Friedenreich jogar em 1935 no São Paulo da Floresta. Ele sempre foi saudosista, contava sobre os jogadores, fatos jocosos, craques farristas e falava que o presidente do clube que ele jogava, o São Bento, era delegado de polícia, sendo que nas vésperas dos jogos prendia os atletas pra não fazerem folia (risos!). Meu pai realmente gostava muito de futebol e talvez seja por isso que eu me enveredei na carreira. O primeiro presente que ele me deu foi uma bola de futebol.
FTT: Quando garoto você tinha ídolos no futebol, jogadores que admirava e se espelhava?
MINELLI: No começo não. Após os 14 anos comecei a jogar no Infantil do Clube Atlético Ypiranga e por força de estar no time, comecei a assistir aos jogos profissionais. A equipe era muito boa, inclusive não foi campeão em determinadas situações porque não deixaram, já que se tratava de um time pequeno. Havia jogadores maravilhosos, como o Liminha (que jogou no Palmeiras), o Doutor Rubens (indo depois para o Flamengo), Bibe (atuou muito tempo no São Paulo e Ponte Preta) e o Silas (centroavante do Fluminense). Grandes jogadores.
NOTA: A entrevista com o Rubens Minelli aconteceu no dia 13 de Fevereiro, sendo que coincidentemente o Bibe faleceu no dia 17.
Ypiranga 1949 - Em pé: Reinaldo, Osvaldo, Homero, Silas, Belmiro, Giancoli e Dema. Agachados: Liminha, Rubens, Bibe e Minelli.FTT: Por sinal quem te levou para o Ypiranga foi o seu próprio pai, que também descobriu o Mario Travaglini.
MINELLI: Fui jogar no Infantil do Ypiranga porque o meu pai trabalhava numa fábrica de meias, era o Gerente Geral, sendo também o Diretor do clube. Como já tinha idade e estava jogando bem na várzea, passei a jogar no Infantil e Juvenil do Ypiranga, indo depois ao Profissional, como ponta-esquerda reserva do Válter (jogou posteriormente na Portuguesa de Desportos), daquele time consagrado que citei. Esses sim foram os meus primeiros ídolos.
FTT: Parece que na ocasião jogou um período no São Paulo Futebol Clube, a partir de 1946.
MINELLI: Realmente, saí do Ypiranga em uma ocasião, fui com alguns amigos fazer um teste no São Paulo e acabamos ficando por lá. Joguei de 1946 à 1947, fui Campeão Juvenil, chegando a jogar nos Aspirantes por algumas vezes. Vicente Feola era o meu treinador. Depois voltei para o Ypiranga, já como Profissional, em 1949.FTT: Qual é a sua lembrança dessa fase profissional no Ypiranga e dos jogadores que enfrentava dos times grandes de São Paulo?
MINELLI: Fui um jogador mediano, não me sobressaí tanto como o Mario Travaglini e o Dino Sani, que foram muito mais longe como jogadores. Tive muitas contusões. É evidente que a partir do momento que se chega à uma equipe profissional, disputando um Campeonato Paulista, jogar contra grandes times como o Corinthians, São Paulo e Palmeiras, o que realmente foi muito bom, deixando boas lembranças.
FTT: Pouco tempo depois teve uma oportunidade de jogar no Nacional da Comendador de Souza.
MINELLI: Tive sim. Entrei na faculdade quando estava parado e jogando na várzea. Houve aqueles festivais varzeanos do dia Primeiro de Maio e havia muitos campos de futebol no bairro do Bom Retiro. Jogamos contra os profissionais do Nacional Atlético Clube, o antigo SPR, cujo treinador era o Caetano de Domenico, que foi meu técnico no Ypiranga, me convidando pra jogar no time e fiquei dois anos lá.
Nacional - Rubens Minelli é o ultimo agachado a direita
FTT: Depois do Nacional jogou no Taubaté, conquistando o seu único título profissional como jogador, o Campeonato Paulista da Segunda Divisão de 1954.
MINELLI: Foi realmente isso. Sempre joguei em times pequenos, com exceção do Ypiranga em um ano que merecia ser campeão e não foi. Eu estava no Palmeiras fazendo um teste, já estudava na faculdade e jogava na Seleção Paulista de Universitários, sendo que numa determinada situação não podia jogar no Parque Antártica, pois já havia começado o Segundo Turno, com o Arnaldo Tirone me indicando ao Taubaté, que procurava jogadores. Tive mesmo a felicidade de conquistar um título da Segunda Divisão Profissional
Taubaté 1954 - Novamente Rubens Minelli é o ultimo agachado a direita
FTT: Pouco depois foi jogar no São Bento de Sorocaba, sendo que foi justamente lá que acabou fraturando a perna em 1956.
MINELLI: Estava na faculdade, não pretendia mais jogar futebol, porque ficava muito difícil pra mim. Era Funcionário Público no Correio, ia à Taubaté pra treinar e voltava de noite pra estudar. Pretendia mesmo parar, mas surgiu essa oportunidade, indo jogar no São Bento de Sorocaba e tive a infelicidade de ter uma fratura muito grave no perônio, que complicou, fui operado, ficando nove meses engessado e resolvi parar em definitivo como jogador de futebol.
RUBENS MINELLI DÁ ENTÃO INICIO A SUA CARREIRA DE TECNICO DE FUTEBOL FTT: Após este triste fato, foi convidado pelo ex-jogador Canhotinho (auxiliar técnico do Oswaldo Brandão no time principal) pra ser treinador das equipes de base do Palmeiras.
MINELLI: É verdade. O Canhotinho e eu estudávamos juntos na Faculdade de Economia, além do Richard (outro antigo meia do Palmeiras), que mora em São João da Boa Vista, sendo que nunca mais o vi. Estudávamos e jogávamos juntos na Seleção Universitária. Trabalhava nos Correios e depois de formado fui trabalhar numa firma de Importação e Exportação, tendo a oportunidade de me reencontrar com o Mílton de Medeiros (Canhotinho), que foi um jogador maravilhoso, jogando no Palmeiras, Seleção Brasileira e na França, sendo o responsável direto para que eu entrasse na profissão de treinador.
Eles precisavam de alguém pra treinar a equipe de base do Palmeiras e como eu tinha fraturado a perna, não estava jogando e tomava conta do time da faculdade, fui convidado pelo Canhoto pra treinar o Infantil do time. A atividade que tinha de tomar conta do time da faculdade era diferente do que teria agora. O Canhotinho quis assistir a minha primeira preleção, falando que teria que ter começo, meio e fim. Ele também treinava o Juvenil, que era conhecido como Cadetes e me chamou pra ver como ele fazia a preleção. Assisti e a partir daí passei a me nortear, vendo o futebol de uma maneira diferente, estudando o porquê das coisas e levando isso até o final da minha carreira. Se um time era forte, queria descobrir porque ele era melhor que o outro, o que me ajudou bastante, porque comecei a ver os pontos fracos e fortes dos times, procurando nessa diferença descobrir a forma de neutralizar os adversários, começando a ter sucesso a partir daí. Fiquei cinco anos nas divisões de base do Palmeiras, ganhando 9 títulos, saindo do clube já formadoJuvenis do Palmeiras na decada de 50 com Rubens Minelli a direita em pé
FTT: Em 1961 você passou a ser também auxiliar técnico do treinador Armando Renganeschi (ex-jogador do São Paulo) no time principal.
MINELLI: Era também o auxiliar técnico do Armando Renganeschi, que pediu a demissão após um resultado ruim de um jogo. Na ocasião ainda era funcionário público e chefe de sessão, sendo que naquele tempo era obrigado a andar de paletó e gravata. Chegando ao Palmeiras, o Alberto Mendes chamou o preparador físico, o Maurício Cardoso, como novo técnico, ou seja, iria mesmo parar.
FTT: Pouco tempo depois surgiu a sua primeira oportunidade como técnico profissional no time do América de São José do Rio Preto em 1963.
MINELLI: Quando ainda era treinador juvenil do Palmeiras, fomos jogar na divisa de São Paulo com o Paraná. Coincidentemente o presidente do América de São José do Rio Preto estava passando por lá, vendo o meu time jogar e se entusiasmou. Depois de uns quinze dias, uma pessoa mandada por ele me procurou, convidando-me pra ser técnico profissional do América, que iria disputar o campeonato da segunda divisão. Teria que modificar completamente a minha vida, mas como vi que não ficaria mais nas divisões de base do Palmeiras, acabei acertando com o clube de São José do Rio Preto, levando uma série de jogadores juvenis muito bons (6 à 7), mas que não eram aproveitados nos titulares, pois naquele tempo, diferente de hoje, achavam que deveriam ir para os profissionais a partir dos 23 anos, sendo que atualmente com 15 ou 16 anos já tem uma oportunidade.Montamos um time muito bom, fomos campeões da segunda divisão e subimos pra primeira. Fiquei dois anos e meio no América.
FTT: Depois do América, você fez foi contratado pelo Botafogo de Ribeirão Preto, realizando uma excursão histórica à América Central, perdendo apenas uma partida em 17 jogos.
MINELLI: Ganhamos um Pentagonal no México e venci um Come-Fogo (clássico contra o Comercial) no início do Campeonato Paulista de 1966, sendo que a euforia em Ribeirão Preto era muito grande por esses resultados. O presidente do América de Rio Preto era o Benedito Teixeira, o Birigui, apareceu por lá pra me levar de volta. Eu era muito amigo do Waldomiro da Silva, o presidente do Botafogo de Ribeirão Preto, que já havia vetado que Ponte Preta me levasse. Expliquei ao presidente do América que não havia condições de retornar, mas ele mesmo foi falar com o Waldomiro. Minha família tinha ficado em Rio Preto, meus filhos estudavam lá, sendo que era a primeira vez que me afastava deles e sentia muitas saudades. O presidente do Botafogo quis saber se eu queria voltar. Respondi que na verdade o meu interesse era estar junto com a minha família. Fui liberado.
A equipe do América estava caindo. Jogamos a última partida contra o Comercial, que tinha alguns importantes jogadores que se destacaram no futebol mineiro, como o Jair Bala. Ganhamos de 5 a 2, com o treinador deles (Alfredinho), tirando o time do campo, portanto foi um jogo marcante.
FTT: Em 1967 veio o convite pra trabalhar no Sport de Recife, sendo que na época o Náutico tinha um timaço, com o Nado e Bita.
MINELLI: O Sport tinha outra estrutura em relação ao América de Rio Preto, um time de ponta em Pernambuco. Realmente o Náutico era o grande pernambucano da época. Mas também montamos uma equipe muito boa no campeonato estadual, vencendo o Torneio Início. Perdemos a final numa jogada de bola parada e mesmo assim fomos páreos com o Náutico o tempo todo.
Minha família foi comigo, mas não se adaptou. Eles acabaram voltando antes e no final do ano, quando resolveram renovar o meu contrato, acabei não acertando, já que não queria ficar sozinho por lá.
FTT: Entre 1968/69 algumas passagens rápidas pela Francana e Guarani.
MINELLI: Pela Francana fui Vice-Campeão da Segunda Divisão de 1968. Já no Guarani fiquei pouco tempo, mas mesmo assim fizemos uma campanha boa.
Mario Travaglini, Orlando Duarte e Rubens Minelli
RUBENS MINELLI VAI PARA O PALMEIRAS
FTT: O Palmeiras o contrata na metade do ano de 1969, dez anos depois da sua estréia nos Infantis do clube. Uma temporada muito boa, conquistando o Torneio Ramón de Carranza e o Roberto Gomes Pedrosa, contribuindo em parte para o surgimento da segunda Academia.
MINELLI: O time da primeira Academia havia envelhecido. Na ocasião queriam montar um time com jogadores do Interior. Contrataram o goleiro Neuri (ex-Marília), Baldochi e Eurico (ex-Botafogo de Ribeirão Preto), Chicão e Copeu (ex-São Bento de Sorocaba), Dé e Serginho (ex-Portuguesa Santista), etc. Mais tarde chegaram o Luís Pereira , Leão, Madurga (que não era titular) e o ponta-direita Ronaldo.
Rubens Minelli orienta Cesar Maluco
FTT: Porque você saiu do Palmeiras em 1971 no decorrer do Campeonato Paulista, entrando o Mario Travaglini no seu lugar?
MINELLI: O Mario Travaglini era administrador do clube na ocasião. Somando toda a minha passagem no Palmeiras, trabalhei durante nove anos em quatro ocasiões (1959 a 1963, 1969 a 1971, 1982/1983 e 1987/1988). Nunca me mandaram embora, pois fui eu mesmo que quis sair. Nesse momento citado por você, fiz um trabalho muito profícuo. No lugar do Travaglini entrou o Oswaldo Brandão, o verdadeiro criador da segunda Academia, sendo duas vezes Campeão Paulista e Brasileiro.
FTT: Após o Palmeiras uma rápida passagem pela Portuguesa de Desportos.
MINELLI: Antes treinei a Ponte Preta, na ocasião que a minha mãe faleceu. Fizemos uma boa campanha, com o time sendo campeão do Interior. A equipe era muito boa, com o Dicá e o Manfrini.
Na Portuguesa realmente foi uma passagem rápida entre o final do Brasileirão de 1971 e início do Paulistão no ano seguinte, mas tive a oportunidade de treinar grandes jogadores como o Marinho Peres, Xaxá, Ratinho e tantos outros.
Rubens Minelli na Portuguesa em 1972
MINELLI CONQUISTA O BICAMPEONATO BRASILEIRO NO INTER
FTT: Vamos agora falar, talvez, da sua melhor fase como treinador, que foi a partir de 1974, quando foi contratado pelo Internacional de Porto Alegre. O que tem a dizer desse período, sendo três vezes seguido Campeão Gaúcho (1974/75/76) e Bicampeão Brasileiro em 1975/76? Comente como foi a formação desse timaço do Inter, com Falcão, Figueroa, Manga e tantos outros.
MINELLI: Minha mãe, como já tinha dito, havia falecido. Meu pai, estando viúvo, não quis morar comigo, preferindo ficar sozinho. Falei pra minha mulher que optaria de ficar um tempo sem trabalhar, preferindo ver como as coisas iriam se encaminhar, pois não tinha irmãs, meu pai possuía duas noras, o que é diferente, mas mesmo assim se deu muito bem.
Na minha casa apareceram o presidente e os diretores de futebol do América de Rio Preto, me convidando pela terceira vez pra ser treinador deles, sendo que eu não queria voltar a treinar na Segunda Divisão, mas mesmo assim aceitei. Curiosamente estava em São Paulo e um amigo me convidou pra assistir um jogo num sábado entre o Corinthians e o Internacional de Porto Alegre (deu empate), mas não tinha nenhuma intenção de ser técnico do time gaúcho. Não tive contato com ninguém.
Depois o São Paulo Futebol Clube foi fazer um jogo em Rio Preto e o presidente do Internacional (Eraldo Hermann), que era são paulino, foi assistir a partida. Ele estava procurando um treinador. Disseram que na cidade havia um técnico muito bom, mas que era rico e fazendeiro, que não queria sair daí. Eu não era nada disso (risos!). Depois de uns quinze dias, o presidente do Inter me telefonou, dizendo que queria conversar comigo, pois precisava de um treinador. Fui pego de surpresa, já que a minha família tinha ido toda pra Rio Preto, criei uma série de dificuldades e dizendo que a estrada era perigosa. Foram então me buscar de avião na cidade, conversamos bastante, fiz uma proposta e eles cobriram. Tive que ir naquele momento, pois o time estava sendo cobrado pela imprensa e torcida, portanto tinham que apresentar o treinador naquele mesmo dia.
O início foi muito difícil, por não conhecer os jogadores, além dos melhores treinadores gaúchos trabalharem em radio e televisão. Você sabe como é, o campeonato começou e havia uma campanha da imprensa para que me mandassem embora. Disse à minha mulher para que fizéssemos os papéis, pois no segundo semestre voltaríamos pra São Paulo.
No começo da competição percebi que os times que vinham enfrentar o Grêmio e o Internacional jogavam com dez atrasados e um recuado, ou seja, saiam dali pra empatar. Os dois times pagavam para os adversários pra ganharem um ponto, para que entrassem no Grenal decisivo com um ponto à frente, para que decidissem como jogariam a partida. As duas equipes usavam muito disso.
Como o time do Inter era bastante forte, comecei a mudar a sua mentalidade, pois iam muito à frente e tomavam um gol. Isso acontecia quando não estão marcados. Fiz o seguinte: “Se o adversário jogar com outros jogadores na frente, faremos o mesmo; caso joguem com 8 atrás, jogaremos também com 8 na frente; meu time é bem mais proporcionado fisicamente e tecnicamente 10 vezes melhor; vou dividir aquele canto deles, quando tinham 8 contra 3 atacantes, dividindo os espaços em cada 10 disputas individuais, ganho 8 e tenho 6 ou 7 chances de fazer o gol”. Isso incorporou, os jogadores gostaram, começamos a ganhar e fomos campeões com nenhum ponto perdido. Ganhamos os dois Grenais e todos os outros jogos.
No ano seguinte, quando começou o Campeonato Brasileiro, as coisas eram vistas de outra maneira, usando a mesma mentalidade de não deixar o adversário jogar, pois quando jogávamos no Rio de Janeiro contra os grandes clubes, marcávamos a saída de bola deles. Foi difícil, pois embora fizéssemos uma campanha maravilhosa, dizia-se que o futebol gaúcho nada e morre na praia. Quando ganhamos do Fluminense no Maracanã, só faltando o Cruzeiro, começaram a achar que o time era bom, pois até então só falavam que tinha defeitos, dizendo que ia perder. Ganhamos do Cruzeiro e fomos campeões.
Já em 1976 foi mais fácil, um time mais personalizado e fortalecido. Quando se trabalha com uma equipe campeã, não precisa de muita mudança, pois se tem dois pontos fracos, dá pra alterar para que o time torne-se mais forte. Agora quando se perde, tem que mandar embora 6 ou 7 jogadores e começar tudo de novo.
Acabamos ganhando dois Brasileirões seguidos e fomos Octacampeões Gaúchos. Quando fui pra lá, tratava-se de uma responsabilidade muito grande, pegar um time que já era Pentacampeão do seu Estado. Imaginava se perdesse o campeonato com a pressão dos técnicos gaúchos que estavam desempregados trabalhando em radio e querendo a minha saída. Eles estavam preocupados porque entrei no lugar do Dino Sani, que também é paulista e havia tomado o lugar deles.
Tinha um contrato de mais um ano, mas meu filho não quis mais ficar por lá e a família queria voltar pra São Paulo. Procurei a diretoria, pedi a revisão do contrato, devolvi a eles uma parte das luvas que havia recebido e retornei pra capital paulista.
TRICAMPEÃO BRASILEIRO CONSECUTIVO, AGORA NO SÃO PAULO
FTT: Foi aí então que o São Paulo Futebol Clube o contratou no início de 1977. Tratava-se um time que falavam que era bem inferior ao do Atlético Mineiro, o que, em minha opinião, acho injusto. Tudo bem que o Atlético fez uma campanha bem melhor, mas o São Paulo também tinha os seus valores, como o Dario Pereyra, Waldir Peres, Zé Sérgio e Serginho Chulapa, que estava numa grande fase. Como aconteceu a conquista do Campeonato Brasileiro de 1977, decidido no início de 78 no Mineirão, além de você ter escalado o Viana, que nem titular era, pra marcar o Toninho Cerezzo?
MINELLI: Você começou essa pergunta falando uma verdade, pois o time do São Paulo não era ruim. Nós pegamos uma chave (a do sul), com clubes mais fortes. O Atlético Mineiro pegou a do norte, ficando 7 ou 8 pontos à frente. Tínhamos que pegar equipes de São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul e eles enfrentaram times de Sergipe e Amazonas, portanto foram ganhando.
O grande segredo pra chegarmos à final foi, como você bem disse, do campeonato parar em 1977 e recomeçar no ano seguinte. Na nossa chave tinha o Corinthians, América do Rio e Internacional de Porto Alegre. O único jogo que faríamos em casa, por questões óbvias, era contra o Corinthians e perdemos por 1 a 0, com todo o mundo achando que estaríamos fora. Quando estava terminando a temporada de 77, reuni a comissão técnica, reclamando que todos iriam pra casa, encher a cara e engordar. Eu trabalhava com o Mario Juliato e o professor Medina. Esse último sugeriu que se convencêssemos os jogadores a estabelecer uma programação para cada um, diminuindo os excessos, poderíamos chegar à segunda fase em uma condição melhor que os outros. Reuni-os, mostrei o plano e toparam. Fiz um exame de insuficiência física e queria ver se quando eles voltassem, estariam do mesmo jeito. Não perderam 5%.
A segunda partida seria contra o Internacional e o diretor deles foi me visitar. O Valmir principalmente, que era o vice-presidente do meu tempo, disse que se eu ainda estivesse lá, seria Tricampeão Brasileiro e agora que estou no São Paulo, jogando dois jogos fora, não iria longe. Eu sabia que o lateral-direito deles, o Cláudio Duarte, disputava um campeonato maravilhoso, era cogitado pra Seleção Brasileira, sentia um problema no joelho. Acabei criando uma situação de jogo. O centroavante Dario jogava pelo lado esquerdo e acabei obrigando-o a jogar pela direita, deixando o Zé Sergio no mano a mano com o Cláudio Duarte e ganhamos por 4 a 1, eliminando eles.
Ganhamos do América do Rio no Maracanã, um time forte, não o Ameriquinha que conhecemos hoje (risos!). Na minha época de Inter, ganhávamos de todo o mundo no Rio, menos do América.
Como disse pra você no início, sempre quis saber o porquê das coisas. O primeiro vídeo cassete no Brasil foi trazido pra mim, sendo que fui eu que comecei a gravar jogos pra voltar a vê-los. Tenho esse vídeo até hoje na minha chácara, aquele grandão (risos!). Comecei a estudar o Atlético, já que teria que disputar um jogo decisivo. A equipe deles girava em torno do Toninho Cerezzo, com o goleiro João Leite jogando a bola pra ele para começar a jogada. Não era um time forte, mas muito rápido. Todas as jogadas começavam com o Cerezzo pelo lado esquerdo. Eu não tinha nenhum jogador capaz de fazer aquela função que eu precisava na minha cabeça, ou seja, não permitir que eles imprimissem essa tática. Havia o Viana, um canhoto baixinho, chato e ranheta, que quando pegava a bola, não a perdia pra ninguém. Estava programado que jogaria o Neca. Naquela noite não dormia, estava com um diretor do São Paulo na concentração do Cruzeiro jogando snooker e matutando até as 7 horas da manhã, tomei um banho e fui tomar o café, chamando em seguida o pessoal pra preleção as 9 e meia. Disse ao Neca que ele não começaria no jogo, sendo que ele, que era titular absoluto e não iniciaria a final, aceitou e disse estar á minha disposição, um profissional excepcional. Quando comecei a desenhar no quadro negro, não coloquei o ponta-direita, os jogadores estranharam dizendo que faltava um jogador. Disse então que jogaria o Viana, que quase caiu do banco, mas conversei com ele explicando o porquê dele ser escalado, dizendo que, quando estivesse com a bola, ninguém tiraria dele, por driblar muito bem e na ocasião que o Cerezzo sair com ela é pra marcá-lo em cima por todas as partes do campo. O João Leite com isso foi obrigado a chutar a bola pra frente, dificultando bastante o time. Não jogávamos recuados, mas mascando o time deles, que era muito forte da intermediária pra trás. Tivemos mais chance de ganhar nos 90 minutos e na prorrogação. Ganhamos nos pênaltis, mas é aquela história: “Só Deus ajudando para o jogador não errar”! O São Paulo foi Campeão Brasileiro em função daquilo que os jogadores fizeram.
FTT: Ficou no São Paulo por certo tempo e em 1979 recebeu um convite pra treinar a Seleção da Arábia Saudita.
MINELLI: Fiquei três anos na Arábia Saudita. Quase nos classificamos pra Copa do Mundo, chegamos à terceira fase, sobrando a Nova Zelândia, China e o Kuwait, que era bastante forte e treinado pelo Carlos Alberto Parreira. O que nos atrapalhou muito é que na Arábia Saudita todos os campos de futebol eram de grana artificial. Existia um campo de futebol da polícia militar que tinha gramado, mas havia uma rusga com o presidente, porque lá tinha dois presidentes, o da Seleção e o da Confederação, que não se davam bem. Quando solicitei o campo da grama natural, tiraram essa e colocaram artificial.
Fomos jogar na Malásia contra a China, porque não me disseram que haveria a reunião e o sorteio, só fiquei sabendo disso depois, pois fizeram por conta deles, sendo que como não existia relação diplomática entre os chineses e os árabes, que eram ligados aos Estados Unidos, eles não tiveram nem a inteligência de trazerem um jogo pra Arábia, já que haveria dois jogos em campo neutro, portanto poderíamos até jogar no Kuwait. Empatamos um jogo e perdemos o outro.
Quando jogamos contra a Nova Zelândia, empataram conosco aos 45 minutos do segundo tempo em uma jogada de arremesso lateral, que foi tão longo, que o jogador deles cabeceou no segundo pau, algo que nunca havia visto na minha vida.
Voltamos pra jogar com o Kuwait e perdemos por 2 a 1, praticamente ficando fora. Ainda existia uma possibilidade, pois a Nova Zelândia veio jogar conosco, sendo que fomos infinitamente superiores no país deles. O futebol na Arábia Saudita era amador, os jogadores não ganhavam salário, sendo que alguns arrumaram emprego na polícia, mas em compensação recebiam muito dinheiro nas conquistas, até mesmo casa. Como iriam jogar contra a Nova Zelândia na própria Arábia, não estavam mais interessados, dizendo que já estavam fora. Só pra você saber, no primeiro tempo desse jogo terminou 5 a 0 pra Nova Zelândia, ou seja, não queriam nada com nada. No intervalo entrei no vestiário e falei pro intérprete repetir tudo que eu dissesse para esses caras no mesmo tom de voz que eu falar, dizendo a maioria dos palavrões que conhecia e eles ficaram assustados com os meus berros (altas risadas!). Entramos no segundo tempo, o time jogou bem, mas fizemos um gol somente no final e perdemos por 5 a 1. Quando acabou a partida, eu estava fora da única Copa do Mundo que disputaria e os jogadores estavam dando risada pela eliminação. Fui até o príncipe e disse que não podia mais trabalhar aqui, sendo que tinha ainda um ano de contrato, pois se ficasse mandaria embora uns dez ou doze desses atletas, mesmo sendo os melhores que tinha. Não é como no Brasil, que quando manda um embora, já surge outro. Era dia 19 de dezembro de 1981, meu aniversário, tomei de 5 a 1 dentro de casa e fiquei fora da Copa do Mundo do ano seguinte, ainda mais sabendo que o príncipe pediu esforço dos jogadores para que vencessem em homenagem à mim. Tinha passagem pra ir embora no dia seguinte, mas só fui liberado em fevereiro de 82. O príncipe queria que eu ficasse, mandou até um intérprete no Brasil pra me convencer, tinha direito à sete passagens de primeira classe com a minha família, o que recebi, pois queria devolver e infelizmente acabou a minha passagem na Arábia Saudita desta maneira.
FTT: Retorna mais uma vez ao Palmeiras em 1982.
MINELLI: Não fui campeão, mas fiquei um ano e meio por lá, tornando-me o técnico que mais tempo ficou no cargo na época em que o Palmeiras estava tantos anos sem ganhar. Como já tinha dito, saí do clube por decisão minha.
VAI PRA O GRÊMIO E QUEBRA A HEGEMONIA DO INTER
FTT: No ano seguinte teve uma passagem pelo Grêmio, sendo Campeão Gaúcho, com o Renato, Valdo e Mazarópi.
MINELLI: Fui Campeão Gaúcho e quebrei a hegemonia do Internacional, que era Pentacampeão, com o Grêmio ganhando por mais cinco anos seguidos. O Valdo começou comigo. A equipe era muito boa, pois além do Mazarópi e do Renato Gaúcho, havia o Bonamigo e um volante muito bom que era o China. O Renato ajudou bastante, maluco também (risos!), mesmo tendo machucado o joelho, pois ele jogava para o time e para ele, driblava o adversário, ia à linha de fundo, fazia gols, mas se não fizesse dificilmente seria aproveitado. Na recomposição do time, ele nunca estava presente, ficando sempre um furo. Quando ele se machucou, coloquei o Valdo na ponta-direita, formando uma ala maravilhosa com o lateral-direito Raul, fazendo misérias. Ganhamos os Grenais e fomos campeões.
FTT: Falaremos agora da sua primeira e única passagem pelo Corinthians, em 1986. Por sinal acho que em junho de 80 já havia recebido uma proposta, mas como tinha contrato na Arábia Saudita, não pode vir.
MINELLI: O Corinthians tentou me contratar umas quatro vezes e nunca deu certo. Quando estava na Arábia Saudita, vim de férias pra São Paulo, com o presidente Vicente Matheus querendo conversar comigo, mas não queria que ninguém soubesse, então não iria a casa dele e nem ele na minha, pois sempre terá alguém indo atrás, o que faz parte do futebol. Ele disse que tinha um escritório na Rua 7 de Abril (Centro de São Paulo) que está sempre fechado. Falou que ninguém sabia, mas tem sempre alguém que sabe. Entrei lá, só tinha pó, fiquei de pé, ou seja, estava fechado há muito tempo (risos!). Ficamos conversando, ele queria mesmo que eu fosse contratado, eu disse que no momento era muito difícil apesar de estar querendo voltar, mas dizia que não dava no momento muito grande com eles, uma família. Não tinha como chegar ao príncipe e dizer isso. Daqui a pouco começaram a bater na porta, alguém do Corinthians ajeitou e a imprensa todinha estava lá. Eu disse que não dou nenhuma entrevista, não tinha nada pra falar, que estava apenas conversando com o Matheus, mas ele acabou falando que tentava me contratar. No dia seguinte saiu nos jornais que Minelli era do Corinthians. Cheguei em Brasília e a embaixada da Arábia Saudita disse que eu estava abandonando o clube. O príncipe me telefonou, dizendo pra mim voltar, pois queria falar comigo. Não queria ir lá por ser o campo dele, então viajei de avião Concorde pra Paris para conversarmos. Chegando no apartamento delem disse que eu estava abandonando o país, mas respondi que não, nada havia acertado, mas é que a minha a família queria retornar, liguei pra minha senhora e pedi para que ficássemos conversando qualquer coisa por uns 10 minutos (risos!). Depois disso voltei pra Arábia sem problema nenhum. Devido a isso recebi 180 mil dólares.
Em 1985, quando estava no Grêmio, me telefonou o presidente do Corinthians, me convidando pra ser treinador do time. Disse que não ia por dois motivos: “O primeiro é que eles já tinham um técnico e por questão ética não aceitaria; em segundo lugar estava trabalhando em outro clube e tenho um contrato”. Se ainda tiver interesse, quando terminar o meu contrato (16/12/85), estou à sua disposição, pois não pretendia no Sul. Foi o que aconteceu. Só que quando fui conversar com eles, tinha acabado a Democracia Corintiana, muitos jogadores seriam mandados embora, com eles querendo que eu fizesse uma relação. Expliquei que assumiria o time, mas que antes de iniciar os treinamentos teriam liberdade total pra dispensarem quem eles quisessem, mas que não me incluísse nessa decisão, pois não tinha nada a ver com isso. Depois que eu chegasse pra treinar o time, dispensarei os que não me servirem, pois não tinha nada nenhum problema de política. Fizeram a limpeza, só sobrando o Biro-Biro, Casagrande, Zenon (que pouco depois foi para o Atlético Mineiro), o lateral-direito Édson, João Paulo e o goleiro Carlos. Fizemos um time que não era forte, mas chegamos a disputar as semifinais e perdemos para o Palmeiras na prorrogação.
FTT: Depois dessa derrota que surgiu a oportunidade de retornar à Arábia Saudita, mas desta vez pra treinar o Al Hilal.
MINELLI: Nas Olimpíadas de 1984 estava lá em Los Angeles assistindo a competição com um grupo de amigos e encontrei um príncipe amigo do Al Hilal, dizendo que ainda me queria lá. Pedi um pouco mais de tempo.
Quando saí do Corinthians, foram sete pessoas da minha família comigo. Fiquei lá por 8 meses, ganhei a Copa das Confederações, perdi o campeonato árabe e fomos Vice-Campeões da Ásia, perdendo a final em casa para o Furukawa do Japão, que tinha um meia-esquerda (Yasuhiko Okudera) que jogou no futebol alemão, que arrebentou com o jogo.
Na ocasião que íamos disputar a Copa do Golfo, tinha um diretor que mexia com cartas, dizendo que se eu saísse o time seria campeão. Pagaram pra mim o que deviam e me mandaram embora, mas o time não ganhou (risos!).
FTT: Teve depois uma rápida e última passagem pelo Palmeiras na Copa União de 1987, substituindo o Valdemar Carabina quase no final da competição, mas saindo logo no início do ano seguinte.
MINELLI: Foi uma passagem bem rápida e como de costume saí do Palmeiras por decisão minha.
FUTEBOL PARANAENSE MAIS UM SUCESSO EM SUA CARREIRA
FTT: Em seguida uma boa passagem pelo futebol paranaense.
MINELLI: Foi interessante isso. No Grêmio o meu preparador físico era o Carlinhos Neves, um excelente profissional. Quando eu não estava trabalhando, ele me ligou em casa, dizendo que haveria uma fusão no Paraná, entre o Colorado e o Pinheiros, fundando o Paraná Clube, uma agremiação muito rica, com duas sedes sociais e três campos de futebol. Ele queria saber se tinha interesse em trabalhar no futebol paranaense. Disse que eu poderia montar a estrutura que quisesse, trabalharia comigo, montaria tudo que fosse necessário, traria um preparador de goleiros, haveria três garotos muito bons na preparação física pra trabalhar conosco quem sabe e tem um bom treinador nas divisões de base. Realmente era uma potência.
Foi uma história muito boa, pois de repente chego lá pra trabalhar com uma função, tinham 60 jogadores, 4 médicos, 4 roupeiros e 4 massagistas. O meu problema maior era exatamente os jogadores, como escolheria, pois não conhecia ninguém. Tive uma idéia, chamei a comissão técnica do Colorado à uma sala, pedindo que eles escolhessem os 15 melhores jogadores do Pinheiros e fiz o mesmo com o pessoal do Pinheiros para que fossem escolhidos os 15 melhores do Colorado. Separei os 30, dividi em 27, formando a base do time.
No primeiro ano perdemos o campeonato. No jogo inicial fomos derrotados para o Coritiba por 1 a 0. Passamos todo o campeonato sem perder. Eram duas chaves. Na segunda, perdemos o último jogo para o Atlético Paranaense por 2 a 1, com o Atlético sendo campeão em cima do Coritiba. Ficamos invictos durante 18 partidas, ganhando ou empatando.
Disputamos a Série C do Campeonato Brasileiro, chegando em segundo lugar e subindo pra Série B.
Fui dispensado, pois havia uma rivalidade muito grande, com o Pinheiros sendo azul e o Colorado era vermelho. Um dia puseram uma placa no chão pra não pisar na grama em letra azul, houve uma reunião onde era questionado porque as letras não eram em vermelho. Eu disse que deveria ser feito um fundo azul com as letras em vermelho. Jogador que era do Colorado e estava na reserva fazia com que a torcida virasse contra e vice versa. Foi difícil. No primeiro ano o diretor era do Pinheiros. Já no segundo era do Colorado, na ocasião em que fui dispensado. Mas consegui montar um time com estrutura, quase chegamos lá e subi da terceira divisão.
O patrimônio do Paraná Clube era sensacional. A sede social do Pinheiros era monstruosa, com um estádio muito bom para 20 mil pessoas. Já o Colorado possuía e possui até hoje também um estádio excelente para 25 mil pessoas. O Pinheiros era totalmente informatizado, fazendo trabalho para a prefeitura do Interior e o pagamento era quinzenal. Fui bem nesses três anos.
Rubens Minelli atualmente
FTT: Inclusive você também foi técnico do Coritiba.
MINELLI: Fui treinador do Coritiba num Campeonato Brasileiro. Também dirigi a equipe em um torneio que ganhamos na final do Botafogo do Rio.
FTT: Depois da fase de treinador foi superintendente de alguns clubes, chegando a trabalhar na Radio Jovem Pan.
MINELLI: Como superintendente trabalhei no Atlético Paranaense, que tinha uma estrutura muito forte, vieram me contratar, naquela mesa à sua frente estive sentado com o presidente Petraglia, ficando das 10 da manhã às 15 horas pra me convencer a trabalhar nessa função. A idéia deles era outra, pois o treinador do time era o Abel Braga, a equipe não estava indo bem, sendo que se o Abel fosse dispensado, eu seria o técnico. Achavam que deveria ser superintendente por ser economista. Eu disse que tinha que ganhar o mesmo que o Abel Braga, pois se aparecesse outra coisa pra ganhar mais, largaria o clube. Eles aceitaram. Mas lá o pessoal é muito torcedor, querem dar palpite, eu ajudava o Abel a não se desgastar com eles. Quando cheguei lá, o Atlético ficou no Hexagonal final, mas em quarto lugar. O Abel Braga me disse que não aguentava mais. Falei com o presidente e o vice, que deixassem ele por minha conta, pra nos unirmos para que o time fosse campeão, o que aconteceu. Entramos no Brasileirão, pegamos de cara três ou quatro jogos muito difíceis, ganhando apenas um e perdendo o restante. Começou gritaria no vestiário, fui me desgastando, chegou um dia que disse umas boas que eles não gostariam de ouvir, sumiram o presidente e o vice, colocaram outras pessoas e fui dispensado.
No São Paulo fiquei um ano e quando faltava uns 15 dias pra terminar o contrato, me dispensaram.
Trabalhei como comentarista em duas Copas do Mundo pela TV Globo. Na Jovem Pan também fui comentarista por um ano e meio, além de participar de um programa no início da tarde de todos os domingos. Foi mais um aprendizado.
Rubens Minelli com Mauricio Sabará
FTT: Farei agora uma pergunta que não sei se alguém já te fez. No futebol você teve muitas alegrias como treinador, mas houve algumas coisas que não conseguiu, pois nunca foi Campeão Paulista, não dirigiu nenhum time do Rio de Janeiro e o que muitos comentam de jamais ter treinado a Seleção Brasileira, mesmo sendo considerado um dos melhores treinadores das décadas de 70 e 80. Considera como mágoa esses exemplos que dei?
MINELLI: Não. Como frustração mais por não ter sido Campeão Paulista, pois cheguei umas quatro ou cinco vezes, mas não conseguir vencer. No Campeonato Paulista, mesmo não tendo sido campeão, fui escolhido por 4 vezes como o melhor técnico da competição.
Nunca treinei algum clube do futebol carioca, mas cheguei a receber uns cinco convites.
Mágoa por não ter ido à Seleção Brasileira é evidente que fica aquele ressentimento, porque no período que poderia ter sido treinador, os técnicos que foram, fracassaram. Tiraram-me o direito de, quem sabe, também fracassar na pior das hipóteses (risos!). Eram treinadores que não tinham feito nada pra estar lá, sendo que foram duas oportunidades. Na última, em 1986, quando era treinador do Corinthians, o Oswaldo Brandão era o meu supervisor, entrou na sala de preleção, com aquele estilo dele pedindo para que parassem, dizendo que agora era comigo, que havia recebido um telefonema e eu era o treinador da Seleção Brasileira. Quando saímos da reunião, tinha uns 5 repórteres, inclusive o J Ávila, Juarez Soares e o Elia Júnior, perguntado sobre isso, mas eu não sabia nada. O que acontece foi que houve uma reunião em São Paulo com o meu nome sendo sugerido. Foram para o Rio de Janeiro. Eu tinha dado uma entrevista nessa ocasião, dizendo que dois jogadores dos quais não citarei os nomes, jamais levaria. Um deles “talvez” levasse caso fosse técnico da Seleção, pois não posso admitir em uma Copa do Mundo com um atleta tendo que ir para se recuperar. Aproveitarem isso no Rio de Janeiro, dizendo que eu criaria problemas, optando então em conservar o Telê Santana, que tinha ido bem em 1982. Ficou aquele lamento de me tirarem o direito de também, quem sabe, fracassar ou ser campeão. Aqui no Brasil não importa que você trabalhe bem, tem mesmo é que ganhar títulos.
FTT: Como última pergunta, falaremos sobre o Muricy Ramalho. Ele conseguiu algo que somente você tinha, que era ser 3 vezes seguidas Campeão Brasileiro, só que no caso dele foi pelo mesmo time, o São Paulo. Isso mudou depois que a Taça Brasil passou a ser reconhecida como Campeonato Brasileiro, com o técnico Luís Alonso Perez (Lula) sendo o recordista pelo Santos. O que dizer do Muricy, que sempre fala tão bem de você?
MINELLI: O Muricy Ramalho foi meu jogador na época do São Paulo e tinha grandes planos para ele, porque já havia sido titular do time, mas teve muitas contusões, não conseguindo se firmar comigo, pois antes da minha chegada era uma das estrelas da equipe. Como trabalhávamos em horário integral, ele sempre tinha menos condição física que os outros devido às lesões, tanto que em uma determinada situação disse à ele que não era possível realizar determinada função, preferindo sempre colocar outro jogador.
Como treinador de futebol, não podemos falar nada do Muricy, pois certa vez ouvi de um determinado técnico que quando trabalhou com ele no Palmeiras, dizer que não sabia nada. Caramba, ele foi campeão no São Caetano, no norte do Brasil, Rio Grande do Sul, China e ganhou 3 Campeonatos Brasileiros seguidos. Merece receber esse tipo de analise?
O Muricy Ramalho fala a língua dos jogadores, tem personalidade, se impõe dentro de sua retórica, fazendo-se entender e é um dos grandes treinadores do Brasil na atualidade e quem sabe até o melhor.
ENTREVISTA: Maurício Sabará Markiewicz.
FOTOS: Estela Mendes Ribeiro.