FTT - Futebol de Todos os Tempos

ENTREVISTAS COM EX JOGADORES, TECNICOS, DIRETORES E PESSOAS LIGADAS AO FUTEBOL QUE CONTRIBUIRAM DE ALGUMA FORMA PARA QUE PUDESSEMOS CONHECERMOS UM POUCO MAIS DA HISTORIA DO FUTEBOL BRASILEIRO E MUNDIAL.

segunda-feira, 26 de março de 2012

O craque disse e eu anotei - VADUCA

Entrevistar Vaduca foi alem do prazer em se falar com alguem que esteve presente dentros das quatro linhas. A principio ele parece ser um senhor sisudo, de pouca conversa mas basta iniciar um bate papo para poder ver que ali está um homem de papo agradavel , memoria excepcional e aquela simplicidade tipica do mineiro.
Osvaldo Liberato ou melhor Vaduca como ficou conhecido nos gramados de Minas Gerais tem uma das mais belas historias escritas no futebol  brasileiro. Do seu nascimento a sua infancia dentro de um estadio de futebol até chegar os dias atuais onde com seus 82 anos trabalha ativamente dentro do futebol profissional do América.
Acompanhem , vale a pena.





FTT – A historia de amor do seu pai e sua mãe daria um belíssimo filme.  Tiveram uma casa construida pelo Villa Nova dentro do estadio para voces morarem?
VADUCA - É nossa familia esteve muito ligada ao Villa Nova. Tinha o campo, a arquibancada e a nossa casa do lado da arquibancada. Fomos criados oito filhos ali.

FTT – Seu pai ajudava na manutenção do estádio?
VADUCA – É, meu pai cuidava do material dos jogadores, da limpeza do vestiário. Depois do treino ele fazia a limpeza novamente. Ele era o zelador do estadio do Villa.

FTT – E sua mãe ajudava em que?
VADUCA – Minha mãe cuidava da roupa, lavava , passava e costurava os uniformes. Cozinhava e fazia tudo para os jogadores . E os jogadores tinham muito carinho pelos meus pais e eles mais ainda pelos jogadores. Eram como se fossem filhos deles tambem.


FTT – Quando criança chegou a ver o Zezé Procopio e o Peracio treinando?
VADUCA – Lembro sim. O Perácio inclusive tinha uma namorada lá perto de casa e os pais dela não queriam que ela namorasse ele. Então ele me pedia e eu levava os bilhetinhos dele pra ela. E ele namorava escondido. A gente passa tanta coisa nesta vida mas tem estas  historias engraçadas que a gente não se esquece.
Perácio foi um dos maiores idolos na historia do Villa Nova. Depois foi atuar no futebol carioca jogando no Botafogo e Flamengo e jogou na Copa do Mundo de 1938


FTT – O Peracio tinha um chute muito forte pelo que dizem.
VADUCA – É ele chutava muito forte mesmo e o Zezé Procopio era um grande lateral.

FTT – O senhor nem poderia imaginar que eles iriam a Copa do Mundo em 38.
VADUCA – Ahh não. Naquele tempo então era muito difícil o reconhecimento aos jogadores de Minas Gerais. Não tinha intercambio. O futebol aqui era muito dificil. Quando íamos jogar em Uberaba, Uberlandia (500 kms de Nova Lima) a gente viajava de ônibus e olhe lá. Hoje os times vão jogar em Ipatinga e vão todos de avião.

FTT – Seu pai comentava alguma coisa sobre eles com vocês?
VADUCA – Não, ele chegava em casa por volta das 20 horas e como nós éramos garotos já estávamos dormindo neste horário. Cedo ele já saia para arrumar o estádio.


FTT – Pelo que sei , sua família está muito ligada ao futebol .
VADUCA – Meu pai teve oito filhos e todos nascidos e criados dentro do estádio do Villa Nova. Destes 5 foram jogadores. Eu, Osório e Juca fomos profissionais e Doca e Antonio somente do amador.

FTT – E quem foi o primeiro a ser jogador?
VADUCA – Foi o Juca. Ele começou no Villa e depois o Atlético fez aquela excursão a Europa e pediram emprestado o meu irmão para atuar para eles. Se sagrou campeão do Gelo e voltando ao Brasil retornou para o Villa Nova. Só que ficou pouco tempo porque aí o Atletico o comprou em definitivo.

JOGOS DO ATLETICO NA EXCURSÃO A EUROPA , NO CHAMADO CAMPEÃO DO GELO
Munich 1860 3 x 4 Atlético, em Munique ( Alemanha )
Hamburger Sportverein 0 x 4 Atlético, em Hamburgo ( Alemanha )
Werder Bremen 3 x 1 Atlético, em Bremen ( Alemanha )
Schalke04 1 x 3 Atlético, em Gelsenkirshen ( Alemanha )
Rapid Wien 3 x 0 Atlético, em Viena ( Áustria )
Sarebruck 0 x 2 Atlético, em Reno ( Áustria )
Anderlecht 1 x 2 Atlético, em Bruxelas ( Bélgica )
Eintracht Brauschweig 3 x 3 Atlético, em Brauschweig ( Alemanha )
Seleção de Luxemburgo 3 x 3 Atlético, em Luxemburgo
Stade Français 1 x 2 Atlético, em Paris ( França )

Time: Cafunga e Mão de Onça (goleiros); Afonso, Oswaldo, Juca, Moreno, Vicente, Zé do Monte, Haroldo, Barbatana, Vicente Perez e Márcio (defesa/meio-campo); Lucas, Lauro, Cezinho, Alvinho, Vavá, Nívio, Vaguinho e Murilinho (atacantes) – Técnico: Ricardo Dies.

FTT – O Juca deve ter jogado no Villa Nova com o Ceci a quem tivemos o prazer de entrevista-lo em São Paulo.
VADUCA – Jogou sim. Eles jogaram juntos antes do Juca ir para o Atletico.

VADUCA E O GOL DO TITULO MINEIRO DO VILLA NOVA

FTT – No Villa Nova o senhor foi começando e logo no segundo ano foi campeão mineiro.
VADUCA – Na verdade eu joguei no Villa Nova desde o infantil. Mas no profissional eu comecei em 50. E tive a felicidade de fazer o gol do titulo em 51 contra o Atlético.


FTT – E o senhor lembra da jogada do gol?
VADUCA – Lembro. O Lito cobrou a falta da intermediaria e eu entrei de cabeça e fiz o gol. Estava chovendo muito e o campo estava pesado.


Vaduca

FTT – Foram três jogos para decidir o campeonato. Se lembra dos resultados?
VADUCA – Na verdade os campeonatos antigamente eram muito mais difíceis. Os times jogavam todo mundo contra todo mundo em turno e returno. Hoje se classificam 4 e só jogam um turno. Antes quem ganhava o primeiro turno disputava com quem ganhava o segundo turno. E foi assim que aconteceu. O Villa Nova ganhou o primeiro turno e o Atlético o segundo. Na decisão era em melhor de três jogos, nós empatamos dois jogos, o primeiro por 1 a1 o segundo em 2 a 2 e vencemos o terceiro .
Finais
13/01/1952 – Villa Nova 1 x 1 Atlético
24/01/1952 – Atlético 2 x 2 Villa Nova
27/01/1952 – Atlético 0 x 1 Villa Nova

Vaduca é carregado pelos torcedores do Villa Nova no gramado do Independencia em 51

FTT – Mas o Villa Nova mereceu o titulo. Era um grande time. A escalação o senhor ainda se lembra?
VADUCA - Arizona, Madeira e Anísio; Vicente, Lito e Tão; Osório, Vaduca, Chumbinho, Foguete e Fradeco ou Escurinho. Primeiro era o Fradeco e depois veio o Escurinho.
                Villa Nova campeão mineiro de 1951 - Este era o quinto titulo do Villa no espaço de 20 anos


FTT – E  a torcida do Villa Nova levou muita gente ao Independencia?
VADUCA – A grande maioria foi do Atlético e nem podia ser diferente. Mas a torcida do Villa compareceu em grande numero e era mais fanática delas todas. Foi gente de ônibus, muita gente de caminhão porque naquele tempo podia e gente de tudo quanto é jeito apareceu. A torcida do Villa sempre foi muito fanática. Eles compareciam não só nos jogos mas nos treinos também.
Ao final da partida a torcida do Villa Nova invadiu o gramado e carregou seus idolos

FTT – Antigamente na torcida do Villa Nova eram somente torcedores do Leão (apelido do Villa) ?
VADUCA – Era. Hoje não. O cara torce pro Villa e para o Atlético ou Cruzeiro tambem. Antigamente você não podia ir a Nova Lima com camisa do Cruzeiro ou Atlético. Hoje não tem problema, já misturou tudo. As arquibancadas eram de madeira e ficava todo mundo expremido porque a torcida lotava o estádio.Hoje não até mesmo porque o Villa não atravessa uma boa fase. Apesar que a diretoria através do Jairo Gomes estar tentando de tudo para levantar o clube. Temos o apoio e patrocínio de um grande supermercado de BH mas ainda é pouco pela tradição do clube.




FTT – E como era o Escurinho ?
VADUCA – Velocista demais. Naquela época nós tínhamos dois pontas velocistas: o Osorio e o Escurinho. Escurinho jogava bem a frente , já o Osorio jogava um pouco recuado. E naquele tempo o time jogava diferente de hoje. Eramos quatro na frente sendo o Osorio e Escurinho nas pontas bem abertos e no miolo eu e o Chumbinho. Eles iam sempre a linha de fundo e cruzavam para gente fazer os gols.
     Escurinho comemorando o titulo nos vestiarios com seus colegas e diretores do Villa Nova
FTT – Como o Fluminense descobriu o Escurinho levando-o depois para lá?
VADUCA – O Villa Nova fez um amistoso contra o Fluminense. O Escurinho foi e jogou uma enormidade. Arrebentou na ponta esquerda. Aí contrataram ele.
FTT – Neste mesmo ano(1951) o Villa Nova disputou um torneio na Bahia e se sagrou campeão. No jogo contra o Bahia voces venceram por 2x0 e um gol seu. Se lembra deste torneio?
VADUCA – Foi um torneio quadrangular de confraternização. Eu me lembro do Bahia e me esqueci dos outros dois times mas fomos campeões. Contra o Bahia eu fiz um gol.
*Participaram do torneio o Bahia e Ypiranga/BA e mais o Vitoria campeão capixaba e o Villa Nova campeão mineiro.O Villa venceu todos os jogos . Vitoria por 2x1 , Bahia por 2x0 e Ypiranga por 1x0.


FTT – E dois anos depois em 1953 novamente a final contra o Atletico e em três jogos. Outra vez dois empates por 1x1 só que o Atletico venceu um jogo por 2x1 e sagrou-se campeão.
VADUCA – Esta infelizmente nós perdemos. Nem gosto de lembrar. Fizemos dois jogos difíceis e empatamos por 1x1 todos dois. O pior foi que no jogo em que o Atletico nos venceu por 2x1 a gente jogou o segundo tempo todo com um homem a mais porque eles tiveram um jogador expulso. Mesmo assim não conseguimos vencer.



FTT – Durante vários anos o senhor jogou contra o Zé do Monte. Nos fale um pouco dele.
VADUCA – Bem naquele tempo a gente chamava de “Center half” (hoje um libero) e ele era habilidoso, jogava de cabeça em pé e tinha um passe muito bom. Os pontas passavam bem com ele porque fazia lançamentos longos para eles.

FTT – Zé do Monte jogava na mesma posição que Toninho Cerezo. O senhor viu os dois jogando. Quem foi melhor?
VADUCA – Dá empate. Os dois foram muito bons.

FTT – E no lado do Cruzeiro dois grandes jogadores: o Abelardo e o Paulo Florencio que foi da seleção brasileira.
VADUCA – O Paulo Florencio era um meia esquerda muito habilidoso, tocava muito bem a bola e apesar de baixa estatura fazia muitos gols de cabeça. Ele jogou na seleção brasileira nos tempos de Siderurgica. Depois o Cruzeiro o comprou. Já o Abelardo era aquele atacante rompedor. Ele tinha o apelido de Flecha Azul porque corria demais. Se ele colocasse a bola 5 centimetros na frente ninguém pegava mais.

 
FTT - O seu irmão Juca aliviava um pouco contra você?
VADUCA – Não, ele não aliviava comigo (risos). Teve uma ocasião que o Afonso colega do Juca na zaga do Atlético me deu uma “paulada” daquelas. Aí o Juca chegou apontando pra mim e nosso outro irmão e disse:” Afonso nestes dois aqui você não bate não, eu não aceito que você bata neles”. Ele chegava junto mas era leal e quando envolve sangue da mesma família ele comprava a briga.
VADUCA VAI PARA O ATLÉTICO E É PENTACAMPEÃO


FTT – No Atletico o senhor chegou para ocupar o lugar de Paulinho Valentim que foi para o Botafogo. Qual era a formação do ataque?
VADUCA – Era o Amorim, Tomazinho,Murilinho e Eu.
FTT – Em 1957 o Atletico fez um amistoso contra o Santos que terminou em 2x2 e o senhor fez um dos gols. Do outro lado estavam Jair Rosa Pinto , Dorval ,Pagão e Pepe. Um timaço que vocês enfrentaram.
VADUCA – Não lembro de detalhes desta partida porque foram muitos jogos que fiz e já se passaram tantos anos mas me lembro que o Pagão e o Jair jogavam muita bola. O Santos tinha um grande time. Era um dos melhores naquela epoca.
FTT - Na campanha do penta campeonato de 1956 o Atletico jogou contra o Villa Nova e ganhou de 4x0. Qual foi a sensação de vencer seu ex-time , de goleada e tendo dois irmãos do outro lado, o Doca e Osorio ?
VADUCA - No futebol não existe isto . Irmandade é fora de campo. Lá dentro são 11 contra 11, cada um defendendo seu clube. Então não tem problema nenhum. Se puder fazer 10 gols você faz. Lá dentro tem a rivalidade e cada um quer defender o seu clube.


FTT - E na decisão de 1956 contra o Cruzeiro novamente dois empates e no terceiro jogo lá estava Vaduca para decidir?
VADUCA - Foi, eu sempre fiz gols decisivos. Ganhamos de 1x0 com um gol meu no final do jogo. Eu era egoista (risos) nas finais venciamos de 1x0 com um gol meu. E o interessante é que o gol do titulo do Atlético, foi no mesmo gol da abertura no Independencia onde eu fiz o gol do titulo do Villa Nova.
   A Equipe PentaCampeã de 1956: (Da esquerda p/ direita) Murilinho, Amorim, Afonso Silva, Toledo,  Vaduca, Tomazinho, Haroldo Lopes, Benito, Hilton Chaves, William e Zeca.


FTT - E naquela época a torcida do Atlético era bem maior do que a do Cruzeiro?
VADUCA - Ahh era. Sempre foi. Hoje em dia é que estou vendo uma pesquisa que fizeram e que fala que a torcida do Cruzeiro tem dois milhões de torcedores a mais do que a do Atlético mas eu acho que não existe isto não. Acho que as duas são iguais. Apesar que o Cruzeiro ganhou muitos titulos nos ultimos tempos e a meninada quer ver é titulos.


FTT - E para comemorar o titulo a diretoria do Atlético organizou uma festa com presenças ilustres, a Dircinha Batista e o Orlando Silva.
VADUCA - A festa foi para a entrega das faixas e eles cantaram na festa. Eles estavam no auge na época.


Tomazinho, Dircinha Batista, Amorin, Orlando Silva, Vaduca e Afonso Silva comemoram o Pentacampeonato de 1956 na sede do Minas Tenis Clube.
FTT – Mas o futebol mineiro teve um outro campeão em 57. O America de Jardel, Toledo, Cazuza, Fantoni, Miltinho e Capeta.
VADUCA – Era um grande time. Era o tempo da Alameda (estádio do América). O time deles foi muito bom. O time tinha muito conjunto, não tinha uma estrela destacada. O Toledo era um atacante rompedor e depois foi jogar no Atlético.
FTT – Eram tempos difíceis os dos jogadores na sua época?
VADUCA – Eram.  Eu por exemplo era pintor e trabalhava 6 horas por dia, subindo e descendo escada e depois das 16 hs ia treinar. A vida não era como a dos jogadores hoje em dia que ficam  só por conta do futebol e tem toda estrutura para eles. Eu hoje vivo no meio deles e sei bem como é.
Vaduca continua gostando de falar sobre futebol e trás detalhes bem guardados em sua memoria

FTT – Antes de encerrar a carreira o senhor saiu do Atletico e foi jogar no Valerio Doce?  Teve um jogo contra seu ex-clube que o Valerio venceu por 1x0 e o gol seu. Qual a sensação?
VADUCA – Antigamente o futebol não dava dinheiro e então eu estava com 28 anos e comecei a preocupar com meu final de carreira. O técnico do Valerio era meu amigo e me conhecia dos tempos de Villa Nova e me convidou para jogar lá. Ele me orientou a sair do Atletico e pedir a direção da Vale do rio Doce para me arranjar um emprego para continuar depois do futebol, para me aposentar lá. Então eu me reuni com o presidente Nelson Campos (pres.Atlético) e pedi para me liberar. Eu tinha seis meses de casado apenas e foi a melhor coisa que eu fiz. Fui muito bem recebido no Valerio e me aposentei pela Vale e graças a Deus ela me deu a condição de ter  todas as coisas que eu tenho hoje.

Bruno e Vaduca


FTT - O Independencia foi inaugurado em 1950. O senhor jogava no Villa e morava em Nova Lima. Como foi a repercussão pelas radios e jornais na epoca?
VADUCA - Eu não acompanhei muita coisa não. Via todo mundo falando de copa do mundo mas ficava  nisto. O que acompanhei de perto foi a seleção inglesa. Naquela época, Nova Lima tinha um nucleo de ingleses que trabalhavam para a mineradora na cidade e recebeu a seleção da Inglaterra. Então a gente ia nos treinos dos ingleses.


FTT - E agora está prestes a inaugurar o novo Independencia. O senhor pretende ir?
VADUCA - Eu gostaria de ir. Geralmente eles lembram de mim e me convidam para as entregas de premios na Rede Globo, na Alterosa e fico muito orgulhoso disto. Quem sabe não lembram novamente .

FTT - Qual foi a partida mais importante da sua vida?
VADUCA - Foi a do titulo do Villa Nova. Você ve que a té hoje todos se lembram dela. A duas semanas atrás quando jogaram Villa x Atletico os jornais Estado de Minas e Hoje em Dia fizeram uma materia de uma pagina comigo lembrando deste jogo e do gol que fiz. Não tem como esquecer.



Entrevista e fotos : Bruno Steinberg










sábado, 24 de março de 2012

Revista do Dia - REVISTA DO PALMEIRAS 1996

A Revista do Palmeiras de 1996 trás em sua capa o craque Djalminha seguindo os caminhos do pai, Djalma Dias.

Encontros eternizados - MÁSPOLI & AUGUSTO 1950

O Goleiro uruguaio Roque Máspoli conforta o lateral brasileiro Augusto após a derrota da seleção brasileira na final da copa do Mundo de 1950 realizada no Maracanã.

sábado, 17 de março de 2012

O Craque disse e eu anotei - FÉLIX

Entrevistar o Félix foi um grande orgulho pra mim, por se tratar do primeiro jogador da Seleção Brasileira de 1970 que tive a felicidade de realizar a matéria (coincidentemente a escalação do time começa com ele). Um depoimento sincero de alguém que sabe do seu valor, passando por muitos desafios, mas nunca desacreditou que venceria no futebol.

FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Félix, você sempre jogou como goleiro nos times profissionais. Quando criança também atuava nessa posição?
FÉLIX: Na várzea tem aquele negócio do 1° e 2° Quadro. No 2° jogava como goleiro e no 1° era ponta-direita e centroavante, sendo inclusive artilheiro do time.

FTT: Quando decidiu então que a sua posição era no gol?
FÉLIX: Quem me descobriu dizia que eu não tinha medo, me atirava no chão, aquele negócio de jogar na rua, sem receio de me jogar nas calçadas de paralelepípedo. Então acabei adquirindo aquele gosto de jogar no gol, que apesar de ser a posição mais ingrata no futebol, considero como a mais bonita.

FTT: Fale do seu início no Juventus da Mooca, indo posteriormente para a Portuguesa de Desportos.
FÉLIX: Meu início mesmo foi nas divisões de base do Juventus. Nasci e fui criado no bairro da Mooca. Saí do clube com 16 anos de idade, indo pra Máquina de Piratininga disputar o Campeonato Amador e com 17 anos fui pra Portuguesa de Desportos assinar como profissional. A Portuguesa, na época, não tinha nem campo, então pra mim foi uma felicidade ir pra lá ainda menor de idade, pedindo autorização ao meu pai.
Em 1957 fui emprestado ao Nacional da Comendador de Souza, porque a Lusa tinha contratado dois grandes goleiros, que eram o Chamorro e o Carlos Alberto Martins Cavalheiro. Então tive que sair pra poder pegar um pouco de experiência, ficando lá por três meses .

FTT: Vamos falar então da sua fase na Portuguesa. Na época, como você bem disse, havia goleiros como o Carlos Alberto e o Chamorro, sendo que um pouco antes também tinha jogado o Cabeção.
FÉLIX: Eu fui emprestado principalmente por causa do Cabeção, pois era um goleiro de Seleção. Os dois goleiros do Corinthians era ele e o Gilmar, que depois foi para o Santos. Não podia ser titular com o Cabeção na minha reserva. O capitão Maurício Cardoso disse que não podia me manter como titular, já que ganhava 5 mil e o Cabeção 22, praticamente o triplo. Não podia ficar no banco de um garoto de 18 anos. No Nacional foram três meses que valeram por um ano, pois fui bastante feliz. Retornei à Portuguesa, peguei a titularidade em 1960 com o técnico Nena e nunca mais larguei, tendo depois que revezar com o falecido Orlando, que veio do São Cristóvão, na época do treinador Wilson Francisco Alves.

Goleiros da Portuguesa - Félix, Reis, Cabeção e Lindolfo


FTT: Na Portuguesa você jogou ao lado de grandes jogadores como Ivair, Lorico e tantos outros, sendo convocado pela primeira vez à Seleção Brasileira em 1965, numa vitória de 5 a 3 contra a Hungria. Qual é a sua lembrança desta partida?
FÉLIX: Muito boa, por ter sido a minha primeira partida na Seleção Brasileira. Já tinha sido convocado pra Seleção Paulista no Campeonato Brasileiro, parece que ganhamos do Paraná e fomos desclassificados pela Seleção de Minas. No time do Brasil eu era o único jogador da Portuguesa (junto com Edílson e Nair). Ser lembrado e jogar contra o time da Hungria, que era um dos melhores do mundo, foi algo muito gratificante.

FTT: Lembrarei-me de um fato interessante, numa partida que a Portuguesa enfrentou a Seleção de Boston, vitória por 12 a 1, que você, por sinal, marcou um gol jogando na linha. Lembra como foi o lance?
FÉLIX: Todo o mundo já tinha sido substituído. Foi num torneio de uma feira em Nova York. Isso fez com que se abrisse o caminho para que outros times disputassem essa competição, como o Santos.
No dia que estávamos jogando contra o time, parece que o treinador Aymoré Moreira, que substituiu à todo o mundo, quando só faltava o goleiro Orlando. Falei para que tirasse o atacante e pusesse o Orlando no gol no meu lugar. Teve um ataque da Portuguesa e marquei com o pé. Dizem que fui um dos pioneiros como goleiro a fazer um gol, o que é diferente em relação ao Rogério Ceni, que faz de falta.
Félix e Ditão contra Pelé

FTT: Ainda na Portuguesa é convocado novamente à Seleção Brasileira em 1967 pra disputar a Copa Rio Branco, que além do Uruguai, teve também participação do Chile. Sei que nessa ocasião jogaram os gaúchos Everaldo e Sadi. Tinha também a zaga do São Paulo, com Jurandir e Roberto Dias. Do lado cruzeirense havia Piazza, Dirceu Lopes, Tostão e Natal. E do Bangu jogou o Paulo Borges. Enfim, um time mesclado com jogadores do Rio Grande do Sul, Cruzeiro e São Paulo. Comente sobre a sua primeira conquista na Seleção.
FÉLIX: Fui Bicampeão da Copa Rio Branco como você lembrou bem. Antecipando, também ganhamos a Copa Rocca de 1971. Essa Rio Branco foi muito boa, jogamos em Montevidéu, capital do Uruguai, jogamos com 0 graus, em baixo de chuva, conseguimos uma vitória que começou a marcar a minha vida como goleiro da Seleção Brasileira.


                                       FÉLIX VAI PARA O FLUMINENSE

FTT: Chegando ao Fluminense, em 1968, já foi ganhando alguns títulos, como a Taça Guanabara e o Campeonato Carioca de 69, além da Taça de Prata de 70 que hoje é considerada como Campeonato Brasileiro.
FÉLIX: Em 1969 ganhei o meu primeiro título como profissional de um clube. Na Portuguesa havia vencido o Campeonato Aspirante de 1957. Na minha estréia no Fluminense fui considerado o melhor jogador em campo pelo jornal do Rio, dizendo que dei uma lição de regra como um goleiro deve se comportar. O meu primeiro título foi inesquecível.
Depois tive que me acostumar a vencer, pois teve 69, em 70 ganhei um Campeonato Mundial e uma Taça de Prata e ainda ganhando os Cariocas de 71, 73 e 75/76. Não existia mais nada pra ganhar. Foi uma época vitoriosa.

FTT: Falando em vitórias, não tem como não citar a Seleção Tricampeã do Mundo de 1970, que para muitos é considerada a maior do Brasil de todos os tempos, o que não sei se é do seu acordo. Grandes partidas, mas existem duas que tinham te marcado mais, como contra a Inglaterra que teve aquele lance que o Francis Lee dividiu uma bola contigo após uma grande defesa e não sei se involuntariamente ou não, acertou o seu rosto. E uma outra grande defesa contra o Uruguai.
FÉLIX:Como você bem lembrou, a Seleção Brasileira não foi considerada a melhor pelo público brasileiro, mas pelos europeus, citada como a Seleção do Século, estou falando isso com convicção, mostrando o valor que temos mais fora do Brasil do que aqui dentro. Digo isso porque sei como somos muito esquecidos por essa conquista, não é comemorada, enquanto que na Europa até o Vice-Campeonato eles comemoram, sendo que aqui vice não existe. Tem que ser campeão e pra festejar você tem que brigar.
Contra a Inglaterra considero que foi o melhor jogo que fiz na Copa do Mundo. Houve uma bola cruzada, o Francis Lee cabeceou, acompanhei o lance, fiz a defesa, a bola escapou da minha mão, bati e abafei, o Lee deitado me deu um chute no rosto e fui à nocaute. Quando você vê o lance percebe que estou no chão tremendo, como se tivesse sido nocauteado mesmo. Pra minha felicidade continuei jogando, indo até o fim, mostrando que tinha condições de ser titular e jogar na equipe do Brasil.
Você citou outro lance, que foi contra o Uruguai. Eu tinha falhado no gol do Cubilla, quicando a bola no morrinho, indo pra dentro e na hora de virar torci o pé. Esse mesmo jogador recebeu um cruzamento fatal aos 7 minutos, puxou o Everaldo pra fora, a bola ia pro ângulo, tive a felicidade de voar, já que o meu apelido na época era Papel por ser magro, peguei a bola e quando cheguei ao chão, batendo ela, acabou escapando, com o Everaldo metendo-a pra frente e fizemos o terceiro gol, os 3 a 1, não os deixando empatar e liquidando o jogo. A equipe do Uruguai vinha com aquela história de vingar 1950, o que não existia, pois havia sido Bicampeão da Copa Rio Branco em cima deles. Futebol é momento.


FTT: Falamos das suas grandes defesas contra a Inglaterra e o Uruguai, mas não podemos deixar de comentar da grande final com a Itália, o momento de maior alegria para os jogadores que foi o Tricampeonato. O que significou essa decisão?
FÉLIX: Tivemos uma reunião na véspera do jogo. O Parreira e o Rogério (que havia sido cortado), como espiões, assistiam as partidas anteriores à nossa. Viram um jogo da Itália, observaram a maneira como os italianos jogavam, marcação homem a homem, sendo que com isso praticamente estávamos tranquilos. Não que achávamos que já ganhamos na véspera, pois inclusive saímos dessa reunião ao ponto do Clodoaldo, um dos mais novos, virando pra mim perguntando como vai ser. Falei pro Corró que para nós que saímos do Brasil, as pessoas desacreditavam que passássemos das oitavas, mas agora vamos disputar um título, portanto hoje somos vices.
O pessoal do Botafogo, que era o Zagallo, Chirol, Paulo Cesar Caju e Jairzinho era supersticioso. Botei um par de luvas na minha mão no dia do jogo contra a Itália, pois não as usava por nunca ter gostado, sendo que eles queriam me arrancar na marra por jamais ter usado. Disse que iria jogar, pra mostrar (principalmente ao João Saldanha) que sei jogar com luvas, já que antes havia sido cortado por isso. Logo aos 7 minutos fiz uma defesa muito boa de um chute de fora da área, botando a bola pra escanteio, com a tranquilidade se abatendo a mim e à todos os jogadores da defesa, sabendo que podiam confiar em mim. Tivemos muita felicidade, foi uma grande partida com excelente exibição e o Brasil vencendo pelo histórico placar de 4 a 1, a mesma contagem quando iniciamos a Copa do Mundo contra a Tchecoslováquia, ou seja, uma goleada no primeiro e último jogo.

FTT: Depois disso continuou a carreira no Fluminense, ganhando os títulos cariocas de 71, 73 e também o de 75, o do início da Máquina. Lembrarei um detalhe de uma defesa histórica que você fez pouco antes da decisão da Taça Guanabara de 1975, com o botafoguense Nilson Dias dominou a bola na entrada da área na meia-lua e de costas executou a famosa bicicleta com você pegando a bola no alto e no meio do gol, encaixando ela diante 110 mil pessoas. Fale sobre essa defesa e também sobre esse Fluminense da Máquina.
FÉLIX: Eu quase fui espirrado da Máquina, pois vinha de uma contusão e o presidente Francisco Horta achava que devia parar. Disse ao Horta que iria me recuperar e voltaria a jogar. Fiz tratamento e voltei pra assinar um contrato de seis meses. Quando acabou o contrato, o presidente me procurou e disse que eu tinha razão, renovando por mais seis meses.
Tive essa felicidade que você falou, com o Nilson dando essa bicicleta, fiz a defesa, segurei e já saí jogando. Na rapidez do lance acabamos fazendo o gol.
Praticamente foram dois títulos em cima do Botafogo. Em 71 fiz uma defesa contra o Paulo Cesar Caju, um dos maiores batedores de falta que conheci depois do Roberto Dias. Ele bateu uma falta, fiz a defesa, me questionando como consegui pegar e eu disse que ele havia treinado comigo na Seleção Brasileira em 1969/70, quando expliquei como goleiro tomava gol, chutar no canto dele quando monta a barreira e sai correndo. Nesse mesmo campeonato o Botafogo estava 6 pontos na frente do Fluminense, com o Caju fazendo dois gols de falta no Andrada, um grande goleiro argentino do Vasco. Chegaram à final com 1 ponto de diferença na frente de nós. Depois de explicar tudo isso pra ele, queria fazer um gol de falta em mim? De jeito nenhum (risos!). Tive a felicidade de defender o chute dele, botei pra escanteio e na cobrança dele soquei a bola que caiu no pé do Oliveira, que foi levando-a até a área do Botafogo, quando foi feito o gol. Ninguém fez falta no goleiro Ubirajara, mas ela foi feita em cima do Brito com o Flávio segurando-o e não o deixando subir, com a bola sobrando para o Lula que fez 1 a 0. Estão chorando até hoje dizendo que o Marco Antônio fez falta no Ubirajara, o que não aconteceu. Conseguimos o título e eu me saí mais uma vez vitorioso, graças a Deus.
Fluminense campeão brasileiro em 1970 - Oliveira, Félix, Denílson, Galhardo, Assis e Marco Antônio; agachados - Cafuringa, Didi, Mickey, Samarone e Lula

FTT: Qual foi o motivo de você ter encerrado a carreira?
FÉLIX: O motivo foi a idade. Depois do episódio que contei do Horta, achando que eu estava aleijado para o futebol, pois havia levado uma pisada no músculo da coxa, houve esmagamento e sofri fazendo infiltração até voltar a jogar. Enquanto isso estava jogando Showbol, que o gol naquela época era duas vezes maior que o do campo, então você vai pegando esse ritmo, então quando voltei a jogar, eu passava das traves, portanto foi muito bom pra mim. Parei com 39 anos de idade, não dava mais pra mim e estava muito cansado (risos!).

FTT: Depois de encerrada a carreira, teve uma rápida passagem como técnico do Avaí em 1982.
FÉLIX: Antes do Avaí houve outros dois times. Fui campeão da 2ª Divisão pelo Madureira, entrando assim na 1ª. De lá fui para o Botafogo do Rio como auxiliar técnico do Jorge Vieira, sendo que quando ele saiu, acabei assumindo interinamente, tendo a felicidade em 1982 de ganhar da Seleção do Chile nos preparativos da Copa do Mundo, numa série invicta. Quando tentei assinar um contrato definitivo com a diretoria botafoguense, achava que não pagariam o que eu estava pedindo. Só que quando fui fazer as minhas contas, acertaram o meu contrato, deram mais do que pedi e mostrei pra eles. Fui para o Avaí, que cobriu a oferta feita pelo Botafogo e perdi o título em Santa Catarina na final contra o Joinvile, mas foi uma aberração, porque era a Portuguesa em São Paulo e o Avaí lá, meteram a mão e perdi o título na decisão.

Félix atualmente


FTT: Como última pergunta, digo que falamos de muitas alegrias, mas, como você bem sabe, houve muitas cobranças ao longo da sua carreira. Quando você começou no Juventus da Mooca, o goleiro era o Oberdan Cattani. Na Portuguesa tinha o Cabeção. No Fluminense anos antes houve o Castilho. E na Seleção Brasileira antes havia jogado o consagrado Gilmar dos Santos Neves. Em cima desses nomes que citei, teve muita cobrança dos torcedores e da imprensa para que você fosse tão bom como eles?
FÉLIX: Você citou o caso do Oberdan Cattani. Eu tinha 16 anos com o Oberdan em final de carreira, um grande nome da história do Palmeiras. Para minha felicidade, sentava no banco com um goleiro como ele jogando, algo muito grande pra mim. Aconteceu que os goleiros do Juventus estavam todos machucados.
Fui para a Portuguesa com 17 anos, encontrando Cabeção, depois veio o Chamorro e o Carlos Alberto. A paciência que tive pra aguentar a tudo isso e mostrar que era bom, o que aconteceu a partir de 1960, tornando-se titular até 68.
Na Seleção Brasileira foi igual, começando a galgar devagar na partida contra a Hungria, vindo depois a Copa Rio Branco e a Rocca. Quando houve as Eliminatórias em 1969, eu era uma das feras do Saldanha, conseguindo classificar a Seleção do Brasil para o Mundial no ano seguinte, jogando como titular em todas as partidas. Não sei por que cargas d’águas quando veio a lista para a Copa do Mundo de 1970, ele me cortou, sendo que a desculpa dele para os jornalistas é que eu era magro, não aguentava o choque com os gringos e que não sabia jogar com luvas. Um dos motivos que me fez usar luvas na final contra a Itália foi esse. Quando ele caiu e o Zagallo me convocou, escreveu na véspera do jogo com a Inglaterra a mesma coisa na Coluna do Brasil e do jornal do México, com a Seleção tendo que trocar o goleiro porque era magro, a mesma desculpa que havia dado quando me cortou. No dia seguinte da partida contra a Inglaterra, os jornalistas ingleses diziam que foram enganados pelos do Brasil, porque não era nada daquilo, pois o goleiro era magro, mas sabia sair do gol, dava soco quando queria, pegava quando podia, então fui considerado um dos melhores do mundo nessa partida. Saí daqui desacreditado, com eles dizendo que o Brasil tinha time, mas não tinha goleiro e felizmente tive que mostrar à cada jogo que eu era o melhor da época.
Quando fui para o Fluminense, o Castilho já havia parado, sendo que inclusive era treinador em Manaus. Já peguei o Jorge Vitório e o Márcio como goleiros. Como fui contratado as pressas na quinta-feira para estrear no domingo, tive a felicidade de ser considerado o melhor em campo. Minha persistência tanto na Portuguesa como em qualquer outro lugar foi insistir no que sabia fazer, que era agarrar no gol.

Mauricio Sabará e Félix


FTT: Félix Mielli Venerando, foi uma honra ter feito essa matéria contigo, entrevistar o goleiro Tricampeão do Mundo de 1970, além de ter sido um histórico arqueiro da Portuguesa, grande também no Fluminense que teve tantos outros bons na sua história, um depoimento verdadeiro de alguém que tem história no futebol brasileiro e mundial.
FÉLIX: Agora você também espera, que eu também vou cobrar por essa entrevista. Pra vocês que querem um carrinho, apareça na Avenida Professor Luís Inácio Anhaia Mello número 4607, que estou aqui para atendê-los. Essa camisa do jogo contra a Itália ainda tenho até hoje, portanto se você é colecionador já fica o lance de 70 e se passar disso pode vir conversar comigo que posso vendê-la pra você. Um abraço, obrigado à vocês e tudo de bom.


ENTREVISTA: Maurício Sabará Markiewicz.
FOTOS: Estela Mendes Ribeiro.

A Revista do Dia - REVISTA DO ESPORTE 1963


A Revista do Esporte de 1963 trás em sua capa tres jogadores da Portuguesa: Nair, Félix e Jair Marinho.

Encontros Eternizados - Leo Moura & Zico


Quem diria que aquele menino, fã de Zico, posando ao seu lado nos anos 80 um dia tambem sería um idolo do Flamengo.

domingo, 11 de março de 2012

O Craque disse e eu anotei - VANTUIR

Vantuir foi uma das entrevistas mais elaboradas que realizei. Conhecedor do futebol, fala muito bem e lembra de detalhes vividos no futebol. Tem uma visão bem esclarecida sobre o que foi o futebol em seu tempo e como anda hoje em dia. Confiram o bate papo com o zagueiro que faz parte da maior parte das seleções de todos os tempos do Atlético.


FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS - Vantuir você começou no futebol de varzea em Belo Horizonte.
VANTUIR - Eu comecei jogando de centro avante. Um amigo me levou pra disputar uma partida no time do Brasil Palace (Hotel em BH). Ele era garçom lá. Me perguntou de que eu jogava e disse que de centro avante. Nós jogamos uma vez e na segunda vez que fomos jogar faltou o lateral esquerdo. Este amigo perguntou se eu não quebraria o galho jogando na lateral , que todos sabiam que não era minha posição mas só para ajudar. Eu joguei , me sai bem e continuei jogando nesta posição.

FTT - A diminuição nos campinhos de bairro , cada vez mais ocupados por predios tem contribuido para a ausencia de tantos jogadores revelados como antigamente?
VANTUIR - A sem duvida. Na minha época os meninos chegavam para treinar nos clubes vindos da varzea com "dom " de jogar bola. Aprendia as coisas nos campinhos dos bairros. Era um dom natural. Hoje os meninos chegam as escolinhas e tem gente dizendo o que tem de fazer, como tem de fazer. A escola antes era a varzea e você ve jogadores como Pelé e Garricnha chegaram ao natural aos clubes, sem preparações. Hoje os tecnicos dos juvenis teem que formar jogadores porque não chegam mais jogadores prontos. Tem que trabalhar os caras para tentar achar um. Antigamente os times tinham pelo menos dois ou tres grandes jogadores na base. Aliado a isto tem o crescimento de outros esportes como o volei, basquete, tenis e a internet. Muitos escolheram outras coisas ao invés de jogar futebol.



FTT - Em 1976 você viu surgir um time praticamente todo feito nas bases com João Leite, Getulio, Danival, Cerezo, Marcelo, Paulo Isidoro, Heleno, Marinho e Reinaldo. Você acha que isto é praticamente impossivel de voltar a acontecer nos dias atuais?
VANTUIR - Muito. Você ve que estes jogadores tinham a parte tecnica que  era excelente e tinha  a parte de amizade e comprometimento com o clube.

Nos juvenis do Atletico nos anos 60. Vantuir é o segundo em pé a partir da direita. O primeiro agachado a esquerda é o ponta Romeu.


FTT - E como você foi para no Atletico?
VANTUIR - Um amigo me levou para fazer teste no Atlético. Eu fiz quatro testes e não fui aprovado. Este mesmo amigo me levou então para fazer um teste no Cruzeiro. Porem o Cruzeiro tinha muita gente para a posição. Na saida do treino um senhor chegou perto de mim e disse: "moço você joga no Cruzeiro?" Eu disse que não , que fui fazer um teste. Ele me perguntou de que eu jogava. Eu disse que de lateral esquerdo. Ele então me perguntou se eu queria fazer uma experiencia lá em Acesita. Eu disse que sim. Fiquei lá por 10 meses. Foi quando novamente este meu amigo me perguntou se eu não queria fazer outro treino no juvenil do Atlético.Eu ainda tinha idade e eu disse que não porque já tinha ido lá quatro vezes e não fui aprovado. Então ele me falou que o treinador mudou que agora era o Dequinha, ex jogador do Flamengo quem cuidava dos juvenis. Eu faltei um treino numa terça feira e fui escondido a Belo Horizonte fazer o treino. Joguei por 20 minutos e o Dequinha já avisou: este aqui não vai embora não. Pode ir lá em cima conversar com a diretoria e nem precisa voltar em Acesita pra buscar suas coisas porque nós mandamos buscar. Eu fiquei então jogando nos juvenis do Atlético.

Atletico 1970 - Em pé a partir da esq. Careca, Humberto Monteiro, Grapete, Vanderlei, Vander e  Vantuir .  Agachados: Vaguinho, Oldair,  Lacy , Lola e Tião. Aqui Vantuir ainda jogando como lateral esquerdo.


FTT - E sua subida aos profissionais foi rapida?
VANTUIR - Na verdade depois o Barbatana assumiu os juvenis do Atletico e eu tive um desentendimento com ele. Me afastou do time por 15 dias. Foi então que o Yustrich que era tecnico dos profissionais chegou e comentou que tinha um menino que jogava bem nos juvenis e que ele queria me ver. Ele ja sabia o que tinha acontecido. Me chamou e eu fiquei frente a frente com aquele homão, parecia um armario. Ele me perguntou o que eu havia aprontado para ser afastado e eu disse que tinha dado uma porrada no auxiliar tecnico. Yustrich então botou o dedo no meu nariz e saiu pressionando minha cara e dizendo "olha esta boca". Eu meio assustado nem sabia op que fazer. Foi quando ele disse: "você vai treinar comigo e quero ver você fazer o que fazia lá". E assim eu comecei. Ele mandava eu fazer uma coisa eu fazia duas. Ele mandou aumentar o meu salario e foi aí que eu vi o que era ser um jogador profissional. Quem me tirou do buraco e me lançou nos profissionais foi o Yustrich.


FTT - Mas explique esta historia. Você começou então no Atlético como lateral esquerdo?
VANTUIR - Foi. Só que eu quase não jogava porque tinha o Cincunegui e depois ainda chegou o Oldair. Foi quando o Tele chegou ao clube . Ele me deixou fora um tempo. Chegou o campeonato mineiro de 70 e o Tele me falou: Vantuir você vai jogar de zagueiro. Eu falei: "não vou não Telê". Nós começamos a andar no campo de um gol até o outro. Ele foi falando comigo que precisava de um quarto zagueiro, que eu era alto, rapido, sabia jogar pelo lado esquerdo. E eu dizia que não queria jogar. Fomos até lá embaixo no outro gol. Fizemos a volta e fomos caminhando em direção ao outro gol novamente. E ele falando, argumentando. Quando chegamos no meio campo eu já não tinha mais tanta certeza do que eu queria. Foi quando eu falei que jogaria uma partida mas se não gostasse voltaria para a lateral esquerda. Tele Santana falou que a resposabilidade era toda dele. Fiz um jogo então contra o Villa Nova e ao final da partida ganhou um trofeu como o melhor em campo. No jogo seguinte de novo outro premio. No final do ano fui eleito na seleção do Trofeu Guará (eleição da Radio Itatiaia). Não sai mais da posição.


Atlético 1970 campeão mineiro - Em pé a partir da esq. Careca, Humberto Monteiro, Vanderlei Paiva,  Grapete, Vantuir e Cincunegui. Agachados Vaguinho, Oldair, Dario, Lacy e Tião.



FTT - Você começou a jogar como quarto zagueiro mas chegou a jogar como zagueiro central. Você que já jogou nas duas acha que quem é zagueiro central tem dificuldades em jogar de quarto zagueiro e vice versa ?
VANTUIR - Depende. Eu era destro jogando da quarto zagueiro então tinha muita facilidade em jogar de um lado ou de outro. Eu procurei aprimorar a minha cobertrura pelo lado direito e isto só com treinamnetos. Joguei entãoinueras partidas como zagueiro central. O jogador tem de querer treinar as deficiencias que possui para poder jogar dos dois lados, ele tem de se completar. Se você joar somente numa posição estranha um pouco mas  se jogar dos dois lados acaba acostumando.


FTT - No campeonato brasileiro de 1971 a zaga variou com Vantuir e Grapete ou Vantuir e Normandes. Você tinha mais facilidade de jogar com quem?
VANTUIR - Eu não tinha problema com nenhum dos dois. Quando eu jogava com o Grapete eu era quarto zagueiro e quando jogava o Normandes eu era zagueiro central. O Normandes era mais tecnico mas conversava pouco. Já o Grapete era mais incisivo nas jogadas e falava mais. Ele jogava pegando a bola do adversario e logo entregava para um companheiro. Já o Normandes tentava dar um chapeuzinho, um drible e eu jogava sempre um passo atrás com medo dele perder a bola.

Vantuir sobe com Jairzinho observado por Grapete.




FTT - Na campanha de 71 teve algum jogo que você destacaria como o melhor?
VANTUIR - Teve. Na verdade teve dois que foram decisivos. É que nós tinhamos de fazer dois jogos seguidos fora. O primeiro foi contra o Santos lá em São Paulo. O Telê falou para mim colar no Pelé. E eu sempre joguei bem contra o Pelé exatamente porque eu procurava não deixar ele receber a bola, porquye se a bola chegasse nele ficava complicado. E foi assim o jogo todo, eu e Grapete colados no Pelé. Faltavam 10 minutos para acabar o jogo e o placar estava 1x1. Foi quando o Pelé foi lá no meio campo conversar com o Nenê. Conversaram, conversaram e eu falei com o Grapete pra gente ficar esperto porque eles estavam armando alguma. Foi quando na primeira jogada o Pelé pega a bola e vem pra cima da gente. Veio com ela e não passava pra ninguem, caminhando em nossa direção e foi aí talvez que eu e Grapete erramos pois fomos recuando, arredando para trás e Pelé com a bola . De repente ele pisa na bola e sai correndo e eu e Grapete fomos atrás dele mas a bola tinha ficado para trás. Pelé tinha pisado nela e correu pra gente ir junto e foi quando o nenê veio de trás e de bico chutou emarcou o gol. Foi uma jogada espetacular. Acabou o jogo e o Pelé veio passando do nosso lado e brincou dizendo: é hoje não deu pessoal. Depois teve o jogo contra o Inter lá em Porto Alegre e necessitávamos da vitoria por que aviamos perdido do Santos. Vencemos por 4x1 e no jogo de volta ganhamos do Santos pr 2x0. Este jogo contra o Inter nos deu muita moral pois ganhar de 4x1 dentro do Beira Rio não é para qualquer um.


FTT – O seu bom futebol no Atlético lhe rendeu frutos. Foi chamado para a seleção brasileira e disputou a Taça Independencia em 1972.
VANTUIR - Foi. A zaga foi formada por mim e o Brito. Jogamos 4 partidas e não levamos nenhum gol. O Brito mais experiente e eu com muita vontade. Fomos campeões da Taça e eu tive uma experiencia muito boa na seleção. Infelizmente quando eu voltei ao Atletico tive uma fratura da tibia em um jogo em Belem contra o Remo que me afastou dos gramados por tres meses. Fiquei um mes com a perna engessada e depois mais dois meses de fisoterapia. O medico do Atletico então viu meus exames e falou que eu podia voltar que estava tudo otimo. Eu podia jogar voltar a jogar como antes.Seus exames estão perfeitos. Pois bem, na primeira bola no treino que entrei com vontade e abriu minha fratuta. Aí complicou e eu tive de ficar mais 4 meses sem jogar. Isto me atrapalhou demais a voltar a seleção. Certamente eu seria chamado para a seleção depois da Taça Independencia. Poderia até não ser titular porque tinham grandes jogadores mas tinha convicção que estaria no grupo e na Copa de 74.


Elenco brasileiro na Taça Independência em 1972. Em pé: Mário Américo (massagista), Leão, Rodrigues Neto, Vantuir, Brito, Gérson, Tostão, Leivinha, Sérgio e Nocaute Jack (massagista). Ao centro: Eurico, Dirceu Lopes, Clodoaldo, Jairzinho, Rivelino, Rogério, Marco Antônio e Wilson Piazza. Embaixo: Zé Maria, Luís Carlos, Dario, Marinho Peres, Paulo César Lima e Lula


FTT - E como foi jogar com o Brito?
VANTUIR - O Brito era um zagueiro seguro, experiente. Fizemos uma zaga muito boa, tanto é que em 4 jogos não sofremos nenhum gol.

FTT – Na final você teve de marcar uma legenda do futebol mundial, Eusebio.
VANTUIR - Nossa, ele era muito rapido e inteligente. Vocvê tinha que marcar em cima mesmo. Excelente jogador.

BRASIL 1 x 0 PORTUGAL
Data: 9 de julho de 1972.
Competição: Taça Independência.
Local: Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro (Brasil).
Público: 99.138 pagantes.
Árbitro: Abraham Klein (Israel).
Gols: Jairzinho 89'.


BRASIL: Leão (Palmeiras-SP), Zé Maria (Corinthians-SP), Brito (Botafogo-RJ), Vantuir (Atlético-MG) e Marco Antônio (Fluminense-RJ) depois Rodrigues Neto (Flamengo-RJ); Clodoaldo (Santos-SP), Gérson (Fluminense-RJ) e Rivellino (Corinthians-SP); Jairzinho (Botafogo-RJ), Leivinha (Palmeiras-SP) depois Dario (Atlético-MG) e Tostão (Vasco-RJ). Técnico: Mário Jorge Lôbo Zagallo.


PORTUGAL: José Henrique Marques, Arthur Correia, Humberto Coelho, Timula Messias e Adolfo Calixto;  "Toni" Oliveira, Jaime Graça e Peres; Jordão (Arthur Jorge Teixeira), Eusébio  e Joaquim Diniz. Técnico: José Augusto de Almeida.




                      VANTUIR VAI PARA O FLAMENGO


FTT – Pouca gente se lembra mas você jogou no Flamengo também.
VANTUIR - Foi. Me perguntaram no Atlético se eu gostaria de jogar no Flamengo pois eles estavam querendo me levar. Eu disse que topava e me transferi.

FTT - E porque ficou pouco tempo no rubro negro?
VANTUIR - Poxa sai do Atletico com 3 meses de salarios atrasados. Cheguei no Flamengo e fiquei 4 meses sem receber. Aí não dá. Fomos campeões cariocas e quando inteirei seis meses resolvi vir embora.

Flamengo 1974 - Em pé a partir da esq. Renato, Vanderlei, Jaime, Vantuir, Pedro Omar e Rodrigues Neto; Agachados: Paulinho, Geraldo, Doval, Zico e Arilson


FTT – No meio campo brilhavam dois talentos, Geraldo e Zico.
VANTUIR - Os dois eram fora de serie. Tinha o Junior que estava começando tambem e começou jogando na lateral direita.

FTT - O Geraldo era muito tecnico mas parecia um pouco lento.
VANTUIR - Era um jogador alto, magro, rápido e de muita visão de jogo. O craque quando a bola chega nele já sabe o que vai fazer e ele sabia. Pensava na frente dos outros. Foi lamentavel a sua morte.

FTT - Você saberia escalar aquele Flamengo?
VANTUIR - O Renato que foi campeão comigo no Atletico, Junior, Jaime , Eu e Rodrigues Neto. Liminha, Geraldo, Zico. Rui Rei,  Doval e Arilson. (Este time teve tambem participações de Vanderley Luxemburgo, Luis Carlos Gualter, Ze Mario e Paulinho)


FTT - Dario ainda estava no Flamengo?
VANTUIR - Não, Dario foi exatamente a moeda de troca comigo. Eu fui e ele veio de volta para o Atlético.


                                       A VOLTA AO ATLÉTICO


FTT - Então depois de seis meses você tambem voltou ao Atletico.
VANTUIR - Voltei.
Na primeira fila, em pé, a partir da esquerda Paulo Benigno (preparador), Barbatana, Vantuir, João Leite, Modesto, Ortiz, Gregório (massagista) e Waltinho (massagista); na fila do meio estão Silvestre, Ângelo, Danilo, Marcio, Flávio, Toninho Cerezo, Dionísio e Getúlio; sentados na primeira fila estão Reinaldo, Marinho, Alfredo, Wallace, Marcelo, Paulo Isidoro, Heleno e Marcinho


  

FTT - E pegou aquela geração fantastica de Cerezo, Reinaldo e cia. Você é quem comandava a moçada ali dentro do campo?
VANTUIR - Era um dos lideres pois fazia o que o tecnico me pedia. Mas sempre conversavamos eu, Cerezo e João Leite. Nós acompanhávmos os nossos jogadores e se chegasse alguem no treino com cheiro de bebida a gente se reunia e dava uma dura. Teve vez da gente chegar no meio campo e pedir o Barbatana para nos deixar sozinhos que queriamos resolver um problema entre nós e falamos o que estava acontecendo. O cara não queria se enquadrar e depois foi reclamar com o Barbatana dizendo que queriamos tira-lo do time. O Barbatana falou que iria ver o que estava acontecendo. E nós falamos o que estava acontecnedo então. Porem raramente levávamos o problema até o Brabatana, pois resolviamos entre nós mesmos. Era um grupo de amigos.

FTT - Você jogou em dois grandes times do Atlético, o campeão brasileiro de 71 e o mineiro de 76. O primeiro com Oldair, Vanderlei, Lola , Dario e Ronaldo. O segundo com Cerezo, Danival, Marcelo, Paulo isidoro e Reinaldo. Em um hipotetico jogo entre os dois times quem venceria?
VANTUIR - O time de 71 era mais treinado. Vinha jogando a mais tempo junto. O time de 76/77 era mais tecnico mas eu acho que o time de 71 venceria.

Atlético de Todos os Tempos - Nelinho, João Leite, Luisinho, Vantuir , Cincunegui e Toninho Cerezo . Agachados: Oldair, Paulo Isidoro, Reinaldo, Dario e Eder


FTT - Você travou duelos memoraveis contra grandes atacantes do Cruzeiro como Tostão, Dirceu Lopes, Evaldo , Palhinha e Joãozinho. Quem dava mais trabalho?
VANTUIR - Teve aí ainda o Roberto Batata. Agora dentro da minha concepção, não tem como não falar de Dirceu Lopes e Tostão. Os dois jogavam mais no meio de campo e chegavam no ataque. O Evaldo abria pros lados e os dois entravam ali. Dirceu Lopes e Tostão tocavam a bola sem olhar. Um dava um tapa pra lá olhando pra cá porque sabia que o companheiro estava lá. Estavam acostumados a jogarem juntos. Eram geniais. Depois destes dois o que pode se aproximar mais deles foi o Joãozinho. Joãozinho era craque na concepção da palavra. Os outros já eram diferentes. Grandes jogadores mas em outro nivel. Agora Tostão, Dirceu Lopes e Evaldo eram impossiveis. Você não sabia onde que os caras estavam. Você procurava e eles já tinham mudado de posição. O Dirceu Lopes era tão inteligente que não dividia as bolas. Imagine ele baixinho daquele jeito dividindo comigo que sou alto. Então ele já pensava antes e dava dribles fantasticos. O Tostão, a primeira coisa que ele fazia era enfiar a bola embaixo das pernas do Vanderlei Paiva e o Vanderlei ficava puto, falava que ia pegar o Tostão e era isto que ele queria. Aí o Tostão deitava e rolava o resto do jogo

Vantuir a esquerda sempre tendo muito trabalho para conter o ataque do Cruzeiro com Dirceu Lopes e Tostão . Grapete está a direita.


FTT - Mas quem era mais dificil de marcar um catimbeiro como o Palhinha ou um tecnico como o Tostão?
VANTUIR - Sem duvida que eu preferia marcar o Palhinha. Ele vinha catimbar , conversava muito com os zagueiros e vinha com aquele papo " é hoje tá dificil " e coisas do tipo pra tentar distrair a gente eu já falava "sai pra lá Palhinha". Vai te catar" . Já o Tostão e Dirceu Lopes não conversavam com agente não. Nem perto chegavam. Depois do jogo sim , eramos amigos. Agora marcar Tostão e Dirceu Lopes. Deus me livre. Era dificil. Tostão jogava de atacante e não era. O Evaldo era atacante a abria nas pontas. Dirceu Lopes chegava de trás toda hora. Você não sabia quem marcava.


Vantuir x Gil

FTT - Antigamente tinhamos craques de verdade .
VANTUIR - Nossa, na minha epoca você fazia seis ou sete seleções muito fortes. Se você tivesse os campeonatos de seleções a diferença era o Pelé jogando em São Paulo. Todas eram muito fortes. O Rio, Minas tinha inumeros craques, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Sul.

VANTUIR VAI PARA O GRÊMIO GANHAR TITULOS



FTT - E falando em Rio Grande do Sul porque você foi para o Grêmio?
VANTUIR - Eu saí do Atlético porque o time não queria pagar o dieito de Arena que era um direito dos jogadores. O Atletico tinha um contrato com a Rede Globo eu fui sozinho na emissora para procurar informações. Claro que a diretoria ficou sabendo. Os jogadores tambem e então o Ziza que era ponta esquerda que veio do Guarani veio me falar que apoiaria e coisa  do tipo. Eu então lhe disse para não fazer isto porque eu já era veterano e se acontecesse alguma coisa eu saia fora, não que estivesse fazendo algo para sair. Disse que eles deveriam continuar. Eu passei a ser um lider negativo para a diretoria.

FTT - Foi chegando ao Grêmio e sendo campeão gaucho?
VANTUIR - O Grêmio montou um grande time. Nosso ataque era muito forte com o Tarciso, Paulo Cesar Caju, o Baltazar e o Eder.


FTT – E a dupla de zaga com Ancheta?
VANTUIR - Jogando com o Ancheta eu aprendi demais. Jogava muito. Tive muita sorte de jogar com ele e depois o De Leon.

FTT - E quem jogava mais o Ancheta ou De Leon?
VANTUIR - Olha , o Ancheta era melhor nas bolas de cabeça , pelo alto. Era mais rápido tambem. Agora o De Leon era mais tecnico, saía mais para o jogo. Eu ficava mais atrás para ele poder subir. De Leon tinha muita noção de cobertura, de espaço.

Vantuir e De Leon

FTT - Chegou o ano de 1980 e o Grêmio fez com o Atletico uma famosa troca, envolvendo o Eder pelo Paulo Isidoro. Você analisando apenas o lado gremista acha que foi melhor o Paulo Isidoro vir ou o Eder deveria ficar?
VANTUIR - O Eder ficou menos tempo no clube. Se não me engano tres anos. Era um jogador dfierenciado mas era meio de "veneta". Tinha dia que ele estava de um jeito, no outro estava diferente. Era muito temperamental. O Paulo Isidoro já era mais de grupo, mais extrovertido e para o sistema do time acho que foi mais importante. Ajudava na marcação, corria o campo todo .


FTT - E não foi apenas o Paulo Isidoro que chegou para reforçar o Grêmio. Um velho rival veio se juntar a voces: Nelinho.
VANTUIR - Fomos eu e Paulo isidoro que intermediamos a vinda do Nelinho para o Grêmio. Já o conheciamos demais por jogar sempre contra ele e sabiamos que tinha muito para dar ao Grêmio. Foi muito importante no nosso bicampeonato.



FTT – Você jogou com grandes cobradores de faltas como o Oldair, Zico, Eder e Nelinho. Destes quem mais te impressionava ?
VANTUIR - .Noossaa (pensativo) o Nelinho e o Eder chutavam demais. Teve uma partida contra o Cruzeiro que eu e meus companheiros falamos para não fazermos falta perto da area pois sabiamos da capacidade do Nelinho. Conseguimos o jogo quase todo mas teve uma hora que não teve jeito e fizeram uma falta perto da area. Já haviamos combinado que se tivesse falta algum jogador nosso deveria passar na frente do Nelinho quando ele fosse correr para bater pois iria tirar o foco dele. Antigamente não era como hoje que o juiz daria um cartão amarelo por isto. E fizemos isto umas quatro vezes. Nelinho então foi até perto da bola, ajeitou e deu um passo apenas pra trás. Bateu na bola com uma curva lá na gaveta. O Careca esperava a bola de um lado e o Nelinho cobrou de outro. Quando saiu para comemorar o gol Nelinho passou perto da gente e gritava:" passa lá na frente, passa lá na frente. Voces são bobos, eu poderia perder na primeira se voces não passassem na frente."

FTT - E porque você não jogou em todos os jogos do Brasileiro em 81?
VANTUIR - Eu joguei diversas partidas mas depois tive uma contusão na panturrilha e fiquei muito tempo afastado. Porem me considero campeão brasileiro tambem porque joguei em muitos jogos.


FTT´- Você acha que este time do Grêmio era mais de pegada do que de tecnica?
VANTUIR - Não, este time era muito bom. Tinhamos o Leão, De Leon, Newmar, Paulo Isidoro, Renato Sá que veio no lugar do Eder, Baltazar, Tarciso. O time era muito forte.


FTT – No final de carreira você atuou no Rio Branco .
VANTUIR - Na verdae eu já tinha parado. Depois do Grêmio eu joguei um tempo no America de Rio Preto mas depois me desentendi com o João Avelino rescindi meu contrato e tinha terminado minha carreira. O presidente do Rio Branco me procurou e me pediu para fazer uma proposta. Eu pedi alto pois não queria jogar mais. Acabou que ele concordou em pagar e me mandou embarcar para Vitoria. Mas eu fiquei lá somente tres meses.
FTT – Mas deu tempo do Rio Branco vencer o Cruzeiro por 3x1 dentro do Mineirão. Se lembra deste jogo?
VANTUIR - (Rindo) Pois é, vencemos o Cruzeiro dentro do Mineirão depois de alguns anos que eu não jogava lá. No jogo de volta eles nos venceram no ES por 2x0 mas o que valeu mesmo foi esta vitoria no Mineirão.

FTT - E neste time do Rio Branco jogava o goleiro Zé Carlos que depois foi para o Flamengo?
VANTUIR - Ele estava começando e jogamos juntos.

FTT- O que faltou ao futebol do Espirito Santo para decolar como os outros estados do Sudeste?
VANTUIR - Acho que alguem que realmente gostasse e tivesse capacidade para organizar o futebol. Não adianta apenas empresarios investirem se não tiver organização. Você ve que a Vale injetava dinheiro e patrocinava a Desportiva. Depois parou e nem sei como anda o time hoje.

FTT – Você chegou a disputar algum clássico contra a Desportiva? Era acirrado como um Cruzeiro x Atletico ou um Grenal?
VANTUIR - Claro que a midia envolvendo um Atletico x Cruzeiro ou um Grenal é muito maior. Agora dentro da realidade do estado é muito acirrado a rivalidade sim. A midia local dá repercussão ao clássico e todos querem vencer. Porem não dá para comparar com os clássicos que eu participei no Mineirão com publicos  acima de 100 mil pessoas.



FTT - Quais foram os maiores zagueiros que você jogou a favor ou contra?
VANTUIR - Luisinho foi inigualavel. Ele só não gostava de disputar bolas na cabeça mas sabia se precisasse. Luisinho era craque. Tinha a excenssia do futebol pois procurava tirar a bola dos adversarios sem fazer faltas. O atacante se distraia e deixava  a bola rolar meio metro e ele dava o bote e tirava a bola. Tinha o Figueroa que era mais de força . Jogava com as asas parecendo uma galinha ciscando mas era o jeito dele, muito bom. Ancheta e De Leon jogavam demais tambem. Aprendi muito com eles. Perfumo era fantastico. Joguei com ele uma partida pela seleção mineira e ele me orientando pois eu estava começando. Procurava fazer tudo que ele me pedia e vi toda sua qualidade. O Grapete foi um zagueiro firme, que jogava sem enfeitar mas era muito seguro. Luis Pereira tambem foi outro que jogava demais. Todos estes que eu falei sabiam jogar. Jogavam limpo e saiam para o jogo tambem. Eu fico feliz por tambem ser lembrado como um dos melhores zagueiros na historia do Atletico juntamente com o Luisinho.

Vantuir atualmente

FTT – Aponte os sete maiores jogadores que você viu em campo.
VANTUIR - Pelé, Tostão e Dirceu Lopes estão em um nivel acima. Eram genios e era muito dificil marca-los. Teve o Lacy que foi injustiçado, merecia melhor sorte. O Reinaldo , minha nossa, está para nascer outro atacante como o Reinaldo. Antes da bola chegar nele , já tinha pensado o que ia fazer e dava só um toque na bola levando o zagueiro. Foi genial.

Bruno com Vantuir


FTT - Você ve algum craque no futebol brasileiro atualmente?
VANTUIR - Não vejo nenhum. Temos o Neymar que é um bom jogador mas ainda tem de provar que é craque de verdade. Quando tem jogos pela seleção ou na Libertadores ele não tem aparecido. Basta lembrar que Pelé com 17 anos foi decisivo e participou da conquista do titulo de campeão do mundo.
Hoje não temos craques. Antigamente pra você marcar um Tostão, Dirceu Lopes, Pelé, Reinaldo era muito dificil. Eles driblavam pra qualquer lado, ja pensavam antes da bola chegar o que fazer. Joãozinho por exemplo não tinha como você marcar. Você fechava por dentro ele cortava pra fora, driblava tanto pra lá como pra cá. Dirceu Lopes era impressionante pois a gente não conseguia nem dividir com ele tamanha a sua inteligencia. E eram jogadores que decidiam. Aliás eu sempre digo que eu fui um privilegiado de jogar de 68 a 84 porque peguei a nata do futebol. Já disse e repito dava para fazermos umas seis seleções brasileiras muito fortes e hoje não conseguimos formar uma.

Vantuir e a Bola de Prata de 1971



Reportagem: Bruno Steinberg