FTT - FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS - Como foi o seu começo no futebol?
AMAURY de CASTRO - Eu comecei nos juvenis do América. Depois fiz cursinho para medicina e como minha familia era toda de médicos resolvi largar e me dedicar aos estudos . Fiquei jogando no Paissandu um time amador de Belo Horizonte. Foi quando o presidente do Sete de Setembro, o Raimundo Sampaio veio me procurar. Eu disse a eles que como eu iria fazer para conciliar meus estudos de medicina com o futebol. Eles me propuseram jogar amadoramente pelo clube, sem receber praticamente nada mas por outro lado quando tivessemos de viajar ou se eu precisasse faltar a algum treino por causa dos estudos eu poderia faze-lo. Nem concentração eu precisava freuentar . Acertei com eles mas eu nunca precisei usar dos direitos que me ofereceram pois fui a todos os treinos e jogos rigorosamente.
FTT - E este seu começo no Sete de Setembro foi quando?
AMAURY de CASTRO - 1954.
Amauri ao centro no inicio de carreira jogando pelo Sete de Setembro.
FTT - E como o Cruzeiro despertou interesse em compra-lo?
AMAURY de CASTRO - No final do segundo turno do campeonato mineiro de 1956 nós jogamos contra o Cruzeiro no estadio Independencia (Campo do Sete de Setembro). Nós empatamos a partida em 2x2 e eu fiz um gol de cabeça. Fiz uma partida muito boa e a torcida do Cruzeiro ficou brava comigo ,muitos até me xingaram no alambrado pois se o Cruzeiro ganhasse seria campeão direto. Falaram comigo...."o que você ganhou com isto" referindo-se ao meu gol. Oras eu era jogador e visava o melhor para o meu time sempre.
O Cruzeiro tinha um time bom e teve uma hora que o Lazzarotti passou por mim e me falou com aquela voz rouca: "É dificil me marcar né menino". Pois então eu virei para o Murilo Silva, aquele mesmo que jogou no Atletico e Corinthians e falei: Murilo eu vou adiantar um pouco, vou marcar o Guerino lá na frente. O Murilo falou que eu podia ir que ele tambem iria adiantar a marcação. Fizemos isto e anulamos o ataque do Cruzeiro.
FTT - Depois deste jogo então o Cruzeiro te procurou?
AMAURY de CASTRO - Foi. Eles foram lá em casa e disseram que queriam me contratar. Perguntaram quanto eu queria ganhar. Eu pedi a eles um minuto enquanto fui lá dentro conversar com meu pai .Ele não entendia nada de futebol pois tambem era medico mas me disse: pede o dobro do que você ganha. Pois eu voltei para a sala e disse que queria ganhar o dobro. Eles toparam imediatamente. Porem os diretores do Sete ficaram sabendo e me procuraram. Eu marquei então uma reunião para as duas diretorias se acertarem. Foi no apartamento do diretor do Sete , sr. Americo Tunes. Fala de lá, fala de cá e nada deles se acertarem. Foi quando eu disse o que aconteceu. Falei que o Sete não queria me pagar nada a mais e que o Cruzeiro me propos o dobro do salario e que apesar de não ter assinado nada já tinha apalavrado com eles e queria jogar lá. Foi então que um dirigente do Cruzeiro falou que devia uma grande contratação a torcida cruzeirense e que por sinal tinham diversos torcedores na portaria do predio esperando. E era verdade mesmo. Então os diretores do Sete aceitaram e eu fui para o Cruzeiro.
Manchete do Jornal Estado de Minas no dia seguinte ao acerto com o Cruzeiro - Acertada a transferencia do magnifico medio do Sete de Setembro - Passe barato e luvas de 60 mil cruzeiros
FTT - Depois de dois anos no Sete de Setembro chegou a vez de disputar o mineiro pelo Cruzeiro.
Amaury de Castro - Foi. Cheguei no Cruzeiro quase no fim de 57 e fui entrando no time. Antes de terminar o campeonato eu já era titular.
Neste ano entretanto, não ganhamos o mineiro pois o America é que venceu.
FTT - Aí você passou a render cada vez mais?
Amaury de Castro - Na verdade eu comecei a jogar cada vez melhor mas aí em 58 eu passei no vestibular. Você imagina o que isto representava para uma familia toda de medicos, do meu pai aos meus tios. Ficava muito dividido entre os estudos e o futebol.
FTT - E neste time do Cruzeiro jogava tambem o Abelardo .
Amaury Castro - O Abelardo foi um grande amigo. Ele jogou muito tempo comigo no Sete de Setembro e o Cruzeiro o trouxe de volta em 59 já no final da carreira. Jogamos juntos sim. Ele sempre foi um tremendo gozador. Chegava nos clássicos contra o Atletico e falava pro Murilo que iria enfiar a bola debaixo das pernas dele.
No encontro a tres anos atrás quando o Cruzeiro lançou camisas retros Amauri Castro e Abelardo voltaram a lembrar de casos engraçados. Amizade que perdura até hoje. Na foto Abelardo conta sua histroia enquanto Amauri dá boas risadas.
Eleito na seleção dos melhores do ano recebendo a medalha de prata em 1958.
FTT - É verdade que em 1958 o Zizinho jogou um amistoso pelo Cruzeiro?
Amaury de Castro - Jogou sim e eu tenho foto ao lado dele. Jogamos juntos. Foi um jogo contra o Santos no Independencia.
FTT - E o Zizinho era este craque mesmo?
Amaury de Castro - Jogava demais. Orientava todos como se fosse jogador veterano do Cruzeiro. "Toca ali, toca aqui"
- FICHA TECNICA DESTE AMISTOSO -
Data: 23/12/1958
Estadio Independencia
Arbitro: Francisco Moreno (SP)
Gols: Pelé 4; Pelé 13, Nivio 15, Pepe 32, Pelé 37, Amaury 27 do segundo tempo.
Cruzeiro: Rossi, Leston, Massinha, Adelino, Clever, Amauri, Emerson, Pelau, Dirceu Pantera, Zizinho e Nivio - Tec. Gerson dos Santos
Santos: Manga (Laercio) Helvio, Dalmo (Feijó), Getulio, Ramiro, Zito (Urubatão), Dorval, Afonsinho, (Hélio), Pagão, Pelé (Coutinho) e Pepe - Tec. Lula
FTT - Este Nivio era aquele mesmo que fez sucesso no Atlético e Bangu?
Amaury de Castro - Ele mesmo, o Nivio Gabrich. Era um excelente pónta esquerda e como jogou muito tempo com o Zizinho no Bangu o convidou para fazer esta partida no Cruzeiro.
FTT - O Cruzeiro então chegou ao tricampeonato começando com o titulo de 59.
Amaury de Castro - O time engrenou. O time já tinha o Massinha , Guerino , Vavá , Dirceu Pantera , Raimundinho e o Abelardo.
Cruzeiro campeão mineiro de 1959 - Amaury é o segundo em pé da direita para esquerda.
FTT - Em 60 o bi
Amaury de Castro - É, ai o time já ganhou novos reforços. O Procopio começou a ser titular formando zaga com Massinha, o Hilton Oliveira na ponta esquerda, o Rossi que veio do Botafogo. Depois chegou o Geraldino que veio do Siderurgica e foi convocado pra seleção brasileira.
A partir do ultimo: Procopio, Amauri, Emerson, Hilton Oliveira, Nilsinho, Massinha, Clever, Nelsinho, Dirceu, Raimundinho e Genivaldo.
FTT - E o senhor chegou a ver então o surgimento daquele time que veio substituir esta geração tricampeã.
Amaury de Castro - Vi nos juvenis o Pedro Paulo, Dirceu Lopes, Natal, Tostão. Vi esta turma treinando varias vezes. Não cheguei a jogar com eles.
FTT - Nesta época era muito dificil os times mineiros enfrentarem os paulistas e cariocas. O senhor se lembra de algum jogo em especial?
Amaury de Castro - Nesta época não tinham estes intercambios entre os estados. Era realmente muito dificil a gente jogar contra os grandes de lá e acabava que ficávamos em desvantagem pois eles estavam sempre se enfrentando. Mas teve um jogo contra o Fluminense que não me esqueço. O Castilho fechou o gol. Nós estavamos ganhando de 1x0 e ele pegando bola de todo jeito. Teve uma que o Hilton Oliveira chutou rasteiro cruzado e ele buscou numa defesa incrivel. O Fluminense era muito forte, tinha o Pinheiro, Tele, Altair, Valdo.
(Este jogo terminou empatado em 1x1 pela Taça Brasil de 60 no Independencia)
Amauri é o segundo em pé a partir da esquerda. Procopio é o ultimo a direita e Hilton Oliveira o ultimo agachado tambem a direita.
FTT - O America nesta epoca estava sempre brigando com Cruzeiro e Atletico pelo titulo.
Amaury de Castro - Eles tinham um time muito bom. Bons jogadores e era deles o melhor estadio da época que era a Alameda.
FTT - Lembre de alguns grandes jogadores do futebol mineiro.
Amaury de Castro - O Murilo Silva foi o maior zagueiro que eu vi. Ele me impressionava pelo jeito de jogar. Quando rebatia a bola não dava chutão de qualquer jeito não. A bola ia certinha pro companheiro. Outro em quem eu me inspirei foi o Zé do Monte que jogou no Atlético. No Cruzeiro teve o Guerino um meia esquerda que jogava muito. Chutava muito bem e era um cruzeirense doente. O Procopio quando chegou , assumiu a vaga na zaga porque era muito bom. Nossa Procopio jogava muito. Teve o Hilton Oliveira que driblava rápido demais e quando jogava a bola na frente ninguem segurava.
FTT - E como eram os jogos contra o Villa Nova e Siderurgica ?
Amaury de Castro - Puxa vida, eram durissimos. O Villa Nova até que eu tive sorte porque ganhar deles lá dentro era quase impossivel e eu nunca perdi no Alçapão. O Siderurgica tinha um grande time tambem. Brigava sempre com os grandes.
Amauri Castro aguradando o sorteio da moedinha do arbitro Cidinho Bola Nossa na partida contra o Siderurgica.
FTT - Qual foi seu melhor treinador?
Amaury de Castro - Niginho sem duvida. Ele tinha dificuldades para falar pois falava pouco e meio italianado mas tinha muita visão e sabia passar o que queria aos jogadores.
(Niginho é até hoje o terceiro tecnico que mais vezes dirigiu o Cruzeiro com otimo aproveitamento - Foram 247 jogos com140 v e 51 d.)
Bruno e o Dr.Amauri Castro |
Amaury de Castro - A do America ia muito ao estadio porque eles tinham acabado de ganhar um campeonato (57). Eram mais ou menos iguais a deles com a do Cruzeiro. Mas depois ,nos anos 60 o Cruzeiro foi ganhando e a nossa torcida foi crescendo sem parar e ultrapassou em muito.
FTT - E exatamente quando o senhor estava no auge, tricampeão resolveu parar com o futebol?
Para se ter ideia da importancia e da qualidade do futebol de Amauri Castro vejam que seu nome está nas listas de dois dos dez escolhidos para elegerem os 10 Mais do Cruzeiro em Todos os Tempos, um belo livro escrito por Claudio Arreguy. Imaginem quanta gente boa ficou de fora e ele teve seu nome lembrado.
Muito bacana a entrevista com o Amauri Castro. Ele, como todo o médico, mostra ser uma pessoa culta e capaz de analisar bem as situações. Foi de uma época em que o futebol mineiro não tinha o seu espaço no cenário nacional, conquistado anos depois com o Cruzeiro de Tostão e Dirceu Lopes. Mas nem por isso Minas Gerais deixava de ter um futebol brilhante, prova disso são os jogadores citados pelo Amauri, como o Murilo, que foi um excelente zagueiro, chegando a ser comparado com o Domingos da Guia e, que além do Atlético, também teve uma boa passagem pelo Corinthians. O também citado Zé do Monte, outro craque. Parabéns Amauri Castro e Bruno pela bela matéria proporcionada aos leitores do Blog.
ResponderExcluirEsta entrevista prova mais uma vez que o futebol de Minas Gerais sempre mereceu destaque nacional, mesmo em tempos que isto não acontecia.Boa Bruno!
ResponderExcluirObrigado por nos mostrar mais um idolo do passado . Se ele não foi tão conhecido assim como tantos outros do Cruzeiro pelo menos honrou nossa camisa sendo tricampeão pelo nosso clube de coração.
ResponderExcluirObrigado Dr. Amauri Castro pela sua dedicação conciliando estudo e o futebol, obrigado Bruno por contar a historia em detalhes.
Foi um prazer entrevistar o Amaury. Primeiramente porque nosso blog tem como tema o futebol e ele escreveu de forma brilhante seu nome na historia do Cruzeiro e do futebol mineiro. Conquistou nada menos do que um tricampeonato em tempos dificeis do clube celeste.Depois e principalmente por se tratar de um ser humano dotado de grandes qualidades tais quais , educação, humildade, integridade e amor a profissão. Não conseguiu seguir carreira no futebol por querer se dedicar com afinco a carreira de medico a qual fez com dedicação.
ResponderExcluirQue seu exemplo seja seguido por jogadores do futebol atual.
Vc ainda faz e posta entrevista aqui na página ??
ExcluirQuero parabenizá-los não só por essa entrevista, mas por todo o blog. O trabalho que vocês fazem é fantástico.
ResponderExcluirO Amaury foi um excelente jogador e eu o admiro muitíssimo. Só se esqueceu de dizer que começou sob o meu comando no Esporte Clube Nacional, disputando um campeonaro infanto juvenil patrocinado pelo "O Diário", o que me levou a buscar o quase impossivel e consegui: filiar o meu clube junto a FMF e disputar o campeonato com os clubes profissionais. Amaury era atacante e fui eu quem o convenceu a atuar de "center half" como se chamava na época. O mesmo aconteceu com o Vinicius, que se dizia ser "center Half"
ResponderExcluire eu o troquei de posição com o Amaury. Depois êle virou "Leão" no Botafogo e vive até hoje na Itália, onde eu o visito e falo por telefone quando vem ao Rio
Deixo aqui o meu abraço ao grande amigo Amaury.
José Alberto Cavedagne
O jogador NILSINHO é meu pai, é um orgulho saber que fez parte de uma grande historia no futebol brasileiro. Ass: Neymar Cunha
ResponderExcluirO jogador NILSINHO é meu pai, é um orgulho saber que fez parte de uma grande historia no futebol brasileiro. Ass: Neymar Cunha
ResponderExcluirEu posso falar que vi o time do melhor do Brasil jogar desde 1962 que time era este meu irmão é isto ai gente isso sim era futebol de verdade. Cláudio de BH. SEMPRE FUI E SEMPRE SEREI CRUZEIRO ESPORTE CLUBE O MEU PAI EU SOU CRUZEIRO MEU PAI.
ResponderExcluirOs pais de meus pais viram eles deixarem a terra natal e criarem raízes na capital BH fez 50 anos e reinava absoluto America e Atlético. O tri campeonato do Cruzeiro foi um divisor de águas. De 59 a 61 a gloriosa campanha do tri e os anos 60 foram marcantes com a a inauguração do Mineirão. De 65 a 69 o penta e finalmente o Cruzeiro desbanca a hegemonia de America e Atlético que era os 2 gigantes do futebol mineiro. O Brasil perplexo viu surgir o Cruzeiro do gênio Tostão e em seguida o Galo de 71 e o melhor America da era Mineirão com Jair Bala, Juca Show, Neneca. Amaury de Castro o craque dentro das quatro linhas se destacava fora das quatro linhas como Medico. De igual modo Marcial que começou no Galo e fez historia no Flamengo. Fez historia dentro das quatro linhas e fora das quatro linhas foi um ilustre Medico.
ResponderExcluirAmaury de Castro, saudoso conterrâneo. Nasceu em Carmopolis de Minas. Um detalhe importante é que ele era irmão do Dr. BH, Célio de Castro!!!
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