FTT - Futebol de Todos os Tempos

ENTREVISTAS COM EX JOGADORES, TECNICOS, DIRETORES E PESSOAS LIGADAS AO FUTEBOL QUE CONTRIBUIRAM DE ALGUMA FORMA PARA QUE PUDESSEMOS CONHECERMOS UM POUCO MAIS DA HISTORIA DO FUTEBOL BRASILEIRO E MUNDIAL.

domingo, 26 de junho de 2011

O Craque disse e eu anotei - LEIVINHA

Quem me passou o telefone do Leivinha foi o seu ex-companheiro Ivair, na ocasião que eu o entrevistei. Quando conversei com ele pela primeira vez, aceitou a entrevista, mas ficamos de marcar mais pela frente. Na segunda tentativa, ele aceitou e marcamos a matéria no Parque da Água Branca. Leivinha tem uma história bonita no futebol e falou com propriedade sobre a sua história e de futebol em geral. Confiram a matéria.

FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Você nasceu na cidade de Novo Horizonte em 1949.
LEIVINHA: Novo Horizonte, Estado de São Paulo, próximo a Lins. Eu quase não comento da cidade que nasci, porque com um ano de idade eu fui para Lins, ficando lá até os 16 anos, quando fui pra Portuguesa de Desportos.

FTT: Sua carreira se inicia no Linense, em 1965.
LEIVINHA: Clube Atlético Linense que, agora nesta temporada, depois de tantos anos, chegou à Primeira Divisão. Naquela época era Segunda Divisão, quando já disputava como Profissional.

Leivinha está no centro entre os jogadores agachados. Na Linense o começo de uma carreira brilhante.

FTT: No ano seguinte você foi contratado pela Portuguesa de Desportos. Fale da sua passagem pela Lusa, jogando ao lado de grandes jogadores, como Ivair, Lorico, Ratinho e Basílio.
LEIVINHA: Foi muito importante a minha chegada na Portuguesa de Desportos, porque naquela época as equipes grandes do futebol paulista, como Corinthians, Santos, São Paulo e Palmeiras, não davam com facilidade oportunidades para um jogador muito jovem como eu, preferindo mais trabalhar com jogadores famosos, que já tinham história no futebol. Já a Portuguesa era o contrário, pois como não tinha muito dinheiro para investir nos grandes jogadores da época, investia em garotos e revelações do Interior. Eu vim nessa leva, com 16 anos, muito jovem ainda, indo direto para o time de cima, porque a Lusa estava passando por uma reformulação, saindo os mais experientes e dando lugar aos jovens que estavam naquele momento. Com uma semana de treinamento, tive a primeira oportunidade, contra o São Paulo, na estréia do Didi Folha Seca, que já estava em final de carreira, jogando pouco tempo lá. Evidente que neste jogo, tomo mundo falava do Didi, sendo que ninguém conhecia o Leivinha. Tivemos sorte e ganhamos o jogo, começando a minha carreira, felizmente de muito sucesso.
Leivinha sobe para cabecear tendo a seu lado o zagueiro Brito no jogo Portuguesa e Vasco da Gama.


Portuguesa de Desportos - Leivinha é o primeiro a esquerda


FTT: Fale um pouco do seu companheiro da Portuguesa, o Ivair Príncipe, que era o grande jogador do clube.
LEIVINHA: Sem dúvida. O Ivair Ferreira era considerado o Príncipe, já que Pelé foi o Rei. Ajudou-me bastante, era o camisa 9 e eu jogava com a 8, formamos a dupla de ataque e ele, com toda a sua experiência, foi muito importante na evolução da minha carreira. Eu prezo muito essa amizade até hoje, ainda nos encontramos, tenho o maior carinho pelo Ivair e agradeço muito a ele por tudo. Temos sempre que aprender a nos espelhar em grandes jogadores, sendo que o Ivair foi um deles.

FTT: Em 1968, por sinal, você teve a sua primeira oportunidade na Seleção Brasileira, numa vitória de 2 a 1 sobre o Coritiba. Você atuou neste dia com jogadores como Félix, Dirceu Lopes, Zé Carlos, Pelé e Tostão.
LEIVINHA: Era muito difícil chegar à Seleção Brasileira jogando na Portuguesa, que não tinha muita força na CBD. Comecei a ter oportunidades em partidas amistosas. Evidentemente que eu não saía jogando, porque jogava o Pelé. Só tinha uma oportunidade quando ele saía. Neste jogo contra o Coritiba, me lembro muito bem, o Tostão também ficou na reserva. Só na hora que saiam o Pelé e o Jairzinho, entramos, juntos com aquela turma do Cruzeiro que tinha o Dirceu Lopes e Zé Carlos. Foi assim que conseguimos virar, pois saímos perdendo. Na época, como até hoje, se dizia que a Seleção não devia fazer amistosos contra clubes, porque pode sofrer uma derrota e ser encarada pela torcida como algo negativo.

FTT: Naquela época você também chegou a jogar na Seleção Paulista.
LEIVINHA: Joguei junto com o Pelé. Depois, pelo Brasil, joguei a Minicopa de 1972 e dois anos depois a Copa do Mundo na Alemanha, onde fiz as três primeiras partidas, mas infelizmente, tive uma contusão no tornozelo, logo no início do jogo contra o Zaire, fiquei fora da Copa apenas como torcedor, mas junto com os companheiros.

FTT: Você é considerado um dos grandes cabeceadores do futebol brasileiro. Quem eram os grandes da época? Sei que tinha o Dario e o Escurinho. Havia mais algum?
LEIVINHA: Realmente eram os que se destacavam mais, foram grandes cabeceadores. Eu tinha uma boa impulsão, sabedor desta virtude, treinava muito em cima disso. Temos que aproveitar as características boas que temos pra desenvolver um grande futebol. Só teve um que teve todas as virtudes fenomenais, que foi o Pelé, chutando com a esquerda e com a direita, cabeceava e até no gol era bom. Nós, pobres mortais (risos), tínhamos facilidades, essa boa impulsão, treinando em cima disso e tive muito destaque.
FTT: O Pelé, como você, também era um grande cabeceador.
LEIVINHA: Também. Tinha 1,73m, não era tão alto, mas tinha uma grande impulsão.

FTT: Você só não viu jogar o Baltazar Cabecinha de Ouro.
LEIVINHA: Infelizmente não vi, mas me falaram que realmente foi o Rei.

LEIVINHA AGORA É DO VERDÃO

FTT: Começa a década de 70, mais precisamente 1971, quando Leivinha é contratado pela Sociedade Esportiva Palmeiras. Qual foi o motivo da sua saída da Portuguesa de Desportos?
LEIVINHA: Tive um amigo muito comum, que era o Candinho, o José Cândido Sotto Mayor, treinador de futebol. Na época era um amigo, gostava de futebol e acompanhava a Portuguesa. Ele trabalhava na TV do Brás, que era de um diretor da Sociedade Esportiva Palmeiras, o Domingos Ianaconi. Foi assim que ele armou junto com os diretores a minha contratação. Então houve um interesse. Na minha posição tinha um jogador uruguaio conhecido como Héctor Silva. No início acabei não jogando, porque o Palmeiras estava jogando a Libertadores da América e eu não estava inscrito, tendo que aguardar o desfecho pra depois disputar a posição. Em um grande jogo contra o Corinthians, não tão bom pra nós, pois acabamos derrotados por 4 a 3, entrei no segundo tempo no lugar do Héctor Silva e a partir daí ganhei a titularidade, marcando um gol nesta partida logo que entrei no goleiro Ado.
Leivinha foi um grande idolo no Palmeiras tambem com grandes exibições.


FTT: Vamos também falar de uma polêmica. Pouco depois deste jogo contra o Corinthians, houve a decisão do Campeonato Paulista de 1971, sendo que você, um exímio cabeceador, fez um gol de cabeça contra o São Paulo, onde apenas o juiz viu mão na bola. Lembra bem deste lance?
LEIVINHA: Lembro perfeitamente. Na época o nosso grande rival era o São Paulo. O Santos praticamente estava em decadência, pois quando enfrentava o Pelé na época de Portuguesa, era complicadíssimo, sendo que depois já estava em final de carreira, indo depois para o Cosmos. O Corinthians não chegava até então. Já o São Paulo tinha um grande time e foi nesta decisão que ficou marcada porque tive a oportunidade de fazer um gol legítimo de cabeça, sendo anulado , achou que aos 18 minutos do segundo tempo. Nós perdíamos por 1 a 0 e, mesmo com o empate, o São Paulo seria campeão, mas naquela altura poderia mudar, pois estávamos em cima. Foi muito mal o Armando Marques e não foi a primeira vez que ele prejudicou o nosso time. O falecido Dulcídio Wanderley Boschillia, que também era árbitro, mas trabalhou neste jogo como auxiliar, correu para o meio de campo. Se tivesse alguma dúvida, o Armando deveria olhar para o auxiliar, mas era algo que ele não gostava, queria assumir tudo e ser a atração da partida, infelizmente errou, ficou marcado, perdemos o título e, até hoje, eu ainda respondo que não foi com a mão, mas legítimo, sendo que a televisão mostrou. Ficou realmente marcado por ser uma final com duas grandes equipes e há 40 anos estou respondendo a mesma coisa, que não foi com a mão (risos).

FTT: Depois desta final, o Palmeiras iniciava uma grande fase da sua história, estava prestes a surgir a Segunda Academia e com o Oswaldo Brandão como treinador. Vieram muitos títulos, como dois Campeonatos Paulistas e o Bi do Brasileirão. Como era o estilo de jogo da Academia, Leivinha?
LEIVINHA: Foi uma grande fase, principalmente em 1972, disputando cinco torneios e ganhando todos, algo muito difícil de acontecer. Era uma equipe muito competitiva, quase não tinha problemas de contusão, mantendo sempre o mesmo time e consequentemente uma regularidade impressionante. O Brandão, pra mim, foi o melhor técnico que tive a oportunidade de trabalhar e sempre tive grande admiração por ele. Tivemos sorte, tínhamos um grupo maravilhoso. Realmente a equipe foi chamada de Segunda Academia, tenho muito orgulho de ter jogado por quase cinco anos, com praticamente os mesmos jogadores, dando pra nós uma condição muito boa dentro do cenário esportivo brasileiro e, porque não, mundial, pois também ganhamos torneios importantes lá fora.
Em pé a partir da esq. Eurico, Leão, Luis Pereira, Alfredo , Dudu e Zeca. Agachados:Edu, Leivinha, Cesar, Ademir da Guia e Nei - Um timaço bi campeão brasileiro.


FTT: O que representou pra você jogadores como César e Ademir da Guia?
LEIVINHA: Importantíssimos. O meio-de-campo com Dudu e Ademir da Guia é como construir um edifício, pois você não precisará somente de engenheiros e obreiros, sendo que há necessidade de haver a complementação. O Dudu era quem marcava e carregava o piano, com o Ademir tocando como o maestro através da sua técnica refinada. Era a mesma coisa o César e eu, uma dupla que deu certo, sendo ele valente e trombador,  enquanto que eu era mais técnico, jogando mais lá atrás, lançando, um complementando o outro. Além disso não podemos esquecer dos outros jogadores, como o Leão, Eurico, Luís Pereira, Alfredo, Zeca, Edu e Nei, além dos reservas como o Ronaldo e Fedato, que eram muito importantes quando entravam. Enfim, um elenco muito competitivo, que conseguiu grandes resultados.

Leivinha correndo com Cesar e abraçando Ademir da Guia











FTT: 1972 foi uma ano importante no Palmeiras e também na Seleção Brasileira, pois justamente aí que você passou a jogar bastante com a Canarinho, ganhando nesta ocasião a Minicopa (Torneio Independência). Nas boas atuações que você teve, achou que a titularidade estava pra ser ganha?
LEIVINHA: Quando fui convocado, o titular era o Paulo César Caju. Em uma partida contra a Iugoslávia, no Morumbi, saiu o Caju, eu entrei, fiz dois gols, assumi a titularidade, joguei a final contra Portugal, quando ganhamos por 1 a 0, jogando meio tempo e entrando o Dario no meu lugar. Enfim, foi a oportunidade que tive na Seleção nessa Minicopa e, no próximo ano, na excursão que fizeram, antes da Copa do Mundo da Alemanha.

FTT: Em 73, você conseguiu uma marca histórica, que foi marcar o milésimo gol da história da Seleção Brasileira. Seu status aumentou bastante desta marca tão importante?
LEIVINHA: Pra mim foi importante, afinal pra mim conseguir 1000 gols é tão difícil (risos), pois acho que na minha carreira não consegui chegar à 350. Imagina o Pelé com mais de 1200 gols encerrando a carreira! Sempre brincava dizendo que não fiz 1000 gols, mas o milésimo estava marcado (risos). Foi um jogo tranquilo contra a Bolívia, no Maracanã, ganhamos de 4 ou 5, tive a oportunidade fazer dois gols, o milésimo e o milésimo primeiro, embora muitos preferiam que fosse um jogador muito mais famoso, já que estava iniciando o meu trabalho. Teve muito mais valor pra mim do que para a história da Seleção Brasileira.

FTT: No ano seguinte, uma grande oportunidade, que foi jogar a Copa do Mundo da Alemanha de 1974. Como você comentou antes, acabou jogando nas três primeiras partidas, mas na vitória de 3 a 0 sobre o Zaire, foi substituído pelo Valdomiro, sendo que depois disso não houve chance de voltar pra disputar os jogos restantes da Copa. Vocês acreditavam que em 74 poderiam vencer?
LEIVINHA: Na verdade foi um sonho muito grande disputar uma Copa do Mundo, era o meu objetivo, foram uns cinco jogadores do Palmeiras, sendo que apenas o Leão, Luís Pereira e eu fomos titulares. Infelizmente foi uma desilusão muito grande, principalmente da minha parte, porque no primeiro jogo foi 0 a 0 contra a Iugoslávia e mais um 0 a 0 na partida seguinte, contra a Escócia. Você imagina para um atacante, eu jogando fora da minha posição, pois o Zagallo me colocou lá na frente, sendo que tinha o Mirandinha e o César. O Jairzinho não queria jogar como centroavante, foi o Furacão da Copa anterior como ponta-direita, sendo que o Zagallo quis me colocar lá na frente, que não era a minha característica. Quem jogou na minha posição foi o Jairzinho. Com isso foi difícil acertar, o Brasil não foi bem nos dois primeiros jogos e, no terceiro, tive a infelicidade, logo no início da partida, com o goleiro do Zaire, que não tinha experiência, se jogou pra pegar uma bola que estava comigo fora da área, caindo em cima do meu tornozelo, tive um entorse muito grande, sendo obrigado a engessar, que naquela época era bem diferente de hoje, acabando a Copa do Mundo pra mim. Queria voltar pro Brasil, mas a Comissão preferiu que eu ficasse lá pra acompanhar e acabei ficando até o final. Pra mim foi uma alegria estar presente na Seleção, ser o titular, me desiludindo depois por causa de contusão. Fiquei ali torcendo, terminando a equipe na quarta colocação, merecendo talvez ficar em segundo, pois ser campeão eu acho que não merecia, porque a Holanda e a própria Alemanha tinham mais condições, já eram times mais certinhos que o Brasil.
Nelinho, Leão, Luis Pereira, Marinho Chagas, Marinho Peres e Piazza. Agachados: Valdomiro, Leivinha, Jairzinho, Rivelino e Paulo Cesar.


FTT: Depois da Copa, mais um Campeonato Paulista, sendo que o Palmeiras tinha um time acostumado a ser campeão, com dois Paulistas e Brasileiros, despontando a decisão contra o Corinthians, que fazia 20 anos que não ganhava um título nesta competição. Qual é a sua recordação desta grande final?
LEIVINHA: Foi uma das grandes alegrias que tive no futebol. O Corinthians havia sido campeão em 1954, 20 anos sem disputar um título, todo mundo sabe da pujança deste clube, com uma grande torcida e um dos times populares do Brasil. Como você disse, o Palmeiras nesta ocasião estava acostumado a disputar títulos e ser campeão. A própria mídia foi toda a favor do Corinthians, acredito que para o próprio futebol seria mais interessante ele ser campeão, sendo uma novidade depois de 20 anos. O que se viu foram 120 mil pessoas no Morumbi, sendo que mais de 100 mil eram corintianos. Os próprios palmeirenses ficaram com receio de ir, imaginando a batalha como perdida. Só nós que acreditávamos que não seria assim, pois sabíamos que tínhamos um time melhor, embora respeitássemos bastante, porque eles tinham o Rivellino, que realmente era um fora-de-série. E foi assim que fomos pra lista, conseguimos um grande resultado, vencendo por 1 a 0, o Palmeiras sendo mais uma vez campeão, valorizado por ter sido contra o Corinthians.
Abaixo  Palmeiras campeão paulista de 1974 e acimaa. Leivinha fazendo um gol contra o America MG








FTT: Após o título começa 1975 e neste mesmo ano o Palmeiras disputa o Troféu Ramón de Carranza. Houve uma partida contra o Real Madrid que você perdeu um pênalti, sendo que pouco depois, tanto você como o Luís Pereira, foram contratados pelo Atlético de Madrid. Fale da sua passagem pelo futebol espanhol, Leivinha.
LEIVINHA: Ganhamos duas vezes o Carranza e depois ganhei mais uma vez pelo Atlético de Madrid. Nós fomos contratados no avião e tinha interesse de um dia jogar na Espanha, porque minha ascendência é espanhola. Mas não queria jogar naquela época. O Palmeiras foi bem, ganhou do Real Madrid e, na volta, dentro do avião, estavam os presidentes, conversaram e se acertaram. O Luís Pereira e eu fomos consultados lá mesmo se queríamos ir pra Espanha. Fiz quatro viagens pra Madrid em quinze dias, voltando para o Palmeiras, retornando pra Espanha para acertar o contrato, voltar para o Brasil pra pegar as minhas coisas e indo pra lá em definitivo. Foi uma correria que eu não esperava, mas acabou sendo ótimo, por tratar-se de uma experiência de quatro anos.
Leivinha e Luis Pereira fotam comprados pelo Atlético de Madrid .
Leivinha brilhou no Atlético de Madrid fazendo muitos gols  no campeonato espanhol.

FTT: Foi justamente na Espanha que você sofreu a contusão mais grave do seu joelho.
LEIVINHA: A primeira contusão no meu joelho foi mesmo na Espanha, já no segundo ano. Na primeira temporada eu fui muito bem, terminamos na quarta colocação e considerado o futebol mais bonito da Espanha. O Luís Pereira teve que fazer uma cirurgia no primeiro ano. Já no segundo, eu me lesionei, ficando oito meses afastado pra poder voltar. As contusões acabaram se sucedendo. Pra mim foram importantes esses quatro anos, o time foi Campeão Espanhol em 1977, superando o Barcelona e o Real Madrid e na época éramos a terceira força da Espanha. Uma experiência importantíssima, era o país que queria estar, fui visitar a terra do meu falecido avô que morava no Interior de São Paulo. É algo que jamais poderei esquecer.

FTT: Em 1979, você retorna ao Brasil e é contratado pelo São Paulo Futebol Clube. Vi no almanaque do clube que você jogou 11 partidas e marcou apenas 2 gols, que foram justamente contra a Portuguesa.
LEIVINHA: Ganhei o passe livre depois de três anos, alugando o meu passe para o Atlético por mais um ano, porque eu não poderia ir pra outra equipe da Espanha, já que na Itália o mercado estava fechado. Resolvi ficar mais uma no e depois seria negociado com o Cosmos de Nova York, que estava praticamente acertado, pois ganhamos deles em uma partida amistosa, fui muito bem e fiz gols. O gozado é que fizemos um acordo verbal no Word Trade Center , olha a curiosidade (risos), sendo acertado que no próximo ano (abril de 1980) eu iria para o Cosmos. Fui jogar no São Paulo, pra não ficar parado, houve um interesse deles, resolvi alugar o meu passe por quatro anos (setembro a dezembro de 79) pra não ficar inativo durante esses seis meses. Infelizmente me machuquei no São Paulo, joguei pouquíssimas partidas, o pessoal lá me tratou muito bem e queriam que eu não saísse pra continuar o tratamento. Eu disse que não tinha interesse em continuar no futebol brasileiro, queria mesmo ir para os Estados Unidos, ficar mais quatro anos e depois encerrar a minha carreira. Infelizmente não deu certo, cumpri os quatro meses com o São Paulo, tentei me preparar pra ir à Nova York, mas não teve jeito e tive que terminar a minha carreira com apenas 29 anos de idade.
Leivinha no São Paulo

FTT: Depois de 79, quando você parou de jogar, como foi a sua vida no futebol?
LEIVINHA: Recebi convites pra ser treinador, mas preferia descansar, parei muito cedo, mas comecei bem jovem no Profissional, com apenas 15 anos. Estava um pouco cansado daquele ambiente, tentando mudar, fazer outras coisas, pois tive fazenda, casa noturna e confecção. Foram varias atividades pra tentar sair do mundo do futebol. Depois voltei com uma escolinha, trabalhando depois no Palmeiras na parte social com os sócios remidos. Na verdade o que sabemos fazer melhor é dentro do campo, pois todo o meu aprendizado foi no futebol. Hoje estou aposentado, não tenho tanta necessidade, graças à Deus minha vida é normal, não sou rico, mas tenho uma família muito boa, com meus filhos se formando. Antigamente não se ganhava tanto dinheiro como hoje. Não me arrependo, porque joguei em equipes grandes e nunca podia reclamar do que ganhava, pois, dentro da época, tinha um bom salário, soube aproveitar, sendo que hoje tenho uma vida relativamente tranquila.

FTT: O que você achou dos grandes times do Palmeiras na Era Parmalat, que também foi uma época vitoriosa?
LEIVINHA: Foi um time excelente o de 1993/94. O Palmeiras estava há muito tempo sem ganhar um título, conseguindo montar, graças à Parmalat, um grande esquadrão. As pessoas costumam perguntar se o da minha época era melhor ou a dos anos 90. Acho que essas comparações são odiosas, porque o futebol é diferente e muda. As vezes vai evoluindo por um lado, sendo que no outro acaba involuindo (risos). Eu, por exemplo, vejo grandes jogadores atualmente, mas na verdade era melhor antes, o futebol era mais técnico e vistoso. Hoje em dia, quando vemos um jogador como o Neymar, é de encher os olhos, porque são poucos. Antigamente tinham melhores jogadores, que sabiam driblar, enfim, era bem mais divertido.
Leivinha e Mauricio Sabará

FTT: O Santos de Neymar, por sinal, foi campeão ontem da Libertadores da América.
LEIVINHA: Pois é. Ainda mais com a volta do Ganso, um jogador com uma classe indiscutível. Ficamos torcendo por fora para que apareçam esses grandes jogadores.

FTT: Você falou do futebol atual. Teve ou tem algum jogador que lembra o seu estilo de jogar?
LEIVINHA: Não sei. Alguns falaram do Kaká quando apareceu, talvez pelo posicionamento dele, com a cabeça erguida. O Kaká esteve muito bem, depois foi pra Europa, solidificando a sua carreira. Fazer comparação assim é difícil. Acho mais fácil comparar no futebol da mesma época, porque ele muda muito, pois são épocas diferentes.

FTT: Pra finalizar, o que você tem a dizer sobre o seu sobrinho, o Lucas Leiva, que jogou no Grêmio, está atualmente no Liverpool, da Inglaterra e que foi convocado pra esta Copa América que começará em breve?
LEIVINHA: Fico muito feliz de ver o Lucas, um garoto maravilhoso, muito jovem ainda, mas determinado e disciplinado, leva bem à sério a profissão e por isso faz sucesso. É como eu falo pra ele, que “agora é contigo, pois eu sou carta fora do baralho”. Tenho mais contato com o pai do Lucas, o meu irmão. Fico feliz por ele, porque acho que merece, é muito jovem (24 anos), mas já é casado, um cara responsável e determinado, que faz da profissão um modelo, da mesma forma que faz o Kaká, só dá bons conselhos e exemplo. O Lucas é igual, pois se está aí, foi porque mereceu.

REPORTAGEM: Maurício Sabará Markiewicz.
FOTOS: Estela Mendes Ribeiro.

Revista do Dia - Revista do Esporte 1961

A capa da revista do Esporte na edição de 29 de Julho de 1961 trás o artilheiro Dida do Flamengo.

Encontros eternizados - Rei Gustaf e Liedholm

Rei Gustaf VI Adolf, da Suécia cumprimenta o jogador Liedholm  na Copa de 1958

quarta-feira, 15 de junho de 2011

O craque disse e eu anotei - MARIO TRAVAGLINI

O telefone do Mario Travaglini já havia conseguido há algum tempo através da Associação Craques de Sempre. Entrei em contato com ele e de imediato marcamos o dia, local e horário da entrevista. Pra mim foi uma satisfação entrevistá-lo, pois era a primeira vez que entrevistava um técnico de futebol. Já havia entrevistado o Dino Sani, que também foi treinador, mas marcou mais como jogador. Travaglini é extremamente inteligente, tranqüilo nas suas respostas e grande conhecedor da sua profissão, além de ter sido jogador de futebol, presidente do Sindicato dos Treinadores e trabalhar ativamente na melhoria das classes que representava. Confiram a matéria.

FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Você nasceu no bairro do Bom Retiro em 1932. Quando criança, quem eram os seus ídolos no futebol?
MARIO TRAVAGLINI: Comecei a jogar futebol com 14 anos. Tinham grandes craques na época, do Palmeiras, São Paulo e Corinthians. Eu observava eles jogando. Nesta ocasião fui Campeão Paulista Infantil do time do Ypiranga em 1948, que foi justamente o primeiro campeonato que disputei.
YPIRANGA anos 50 - Mario Travaglini é o terceiro em pé a partir da esquerda.

FTT: Parece que você foi descoberto pelo pai do Rubens Minelli, o Francisco Minelli.
TRAVAGLINI: Muitos jogadores da várzea iam para os clubes. O bairro do Bom Retiro foi um celeiro de jogadores e treinadores, como o próprio Rubens Minelli,sendo que seu pai me levou para os Infantis, começando a minha carreira.

FTT: A sua estréia no time Profissional foi em 1953, numa partida contra o Corinthians. Qual é a sua recordação deste primeiro jogo?
TRAVAGLINI: Houve uma surpresa, porque não estava preparado, sendo que nunca tinha treinado pela equipe Profissional. Eu jogava nos Aspirantes, já morava na Barra Funda e  o jogo foi no Pacaembu. Chegando lá, o técnico dos Aspirantes disse que não iria jogar  porque o Sastre, que era o técnico dos Profissionais, queria colocar o substituto para o Giancoli, que era o beque-central, pois houve um problema de saúde com ele. O Sastre, que foi jogador do São Paulo, me disse algumas palavras, dizendo que tinha que jogar o que sei, porque havia me visto jogando. Aquilo foi o meu alicerce. Joguei bem contra o Corinthians e de lá pra cá passei a ser Profissional, sendo depois treinador.
FTT: Você atuava como zagueiro, enfrentando grandes ataques, como o do Corinthians, Portuguesa, São Paulo, Palmeiras e Santos.
TRAVAGLINI: Haviam grandes atacantes. Era muito difícil marcá-los.

FTT: Depois foi para o Palmeiras, jogando em um grande time, com Jair Rosa Pinto, Rodrigues, Waldemar Fiúme e, chegando, depois, o Mazzola.
TRAVAGLINI: Fui contratado pelo Palmeiras em 1955. Lembro que jogavam o Laércio, Manuelito, Mário, Valdemar Carabina (que já tinha jogado no Ypiranga), Dema, Liminha, Humberto Tozzi, Nei, Jair Rosa Pinto e Rodrigues. Essa foi a equipe que joguei. Tive uma contusão e fui emprestado para o Nacional.
Em pé a partir da esq. Laercio, Manoelito, Mario Travaglini, Ruarinho, Gersio Passadore e Waldemar Fiume. Agachados: Renatinho, Liminha, Humberto Tozzi, Jair Rosa pinto e Rodrigues Tatu.


FTT: Se não me engano, você jogou na Ponte Preta no final de carreira.
TRAVAGLINI: Joguei três meses lá. Tinha um emprego na estrada de ferro Santos/Jundiaí, porque em 1955 me formei em Economia. Acabei abandonando o futebol. Passou um tempo e o Palmeiras foi me chamar pra trabalhar nas Divisões de Base, pois o Rubens Minelli era o técnico e havia sido contratado por outro clube, iniciando assim a minha carreira de treinador.

FTT: No seu início de carreira, era interino.
TRAVAGLINI: Comecei em 1963. Fui Campeão Infantil, Juvenil e Aspirante. Era também auxiliar. Naquela época, pra ser treinador, era mais tranquilo. Nessa interinidade, dirigi o Palmeiras por dez vezes, ganhando o Campeonato Paulista de 1966 e a Taça Brasil no ano seguinte. Fiquei praticamente até 1971, quando começou a minha carreira como supervisor, que hoje é o gestor. Fomos dando  sentido à esta gerência e quando havia a saída de um treinador, eu o substituía. Acabei indo para o Rio de Janeiro, que já é uma outra história.

FTT: O time do Palmeiras de 1966/67 era a Academia que havia sido deixada pelo Filpo Nuñes.
TRAVAGLINI: Pude ver as duas Academias, pois em 1971 o Oswaldo Brandão estava chegando, quando fui Vice-Campeão Paulista contra o São Paulo.

FTT: Você comentou que a partir da década de 70 foi para o futebol carioca, que não conhecia tão bem como o paulista e passou a ser treinador do Vasco da Gama.
TRAVAGLINI: Comecei no Fluminense, que precisava de um treinador pra resolver alguns problemas, porque havia uma eleição e tive um contrato de risco, pois se a oposição vencesse, eu estaria fora. Decidimos o título de 1972 contra o Flamengo, pois tínhamos vencido a Taça Guanabara e eles foram campeões. Fui muito bem tratado lá e aceitei o contrato de risco. As portas se abriram pra mim, indo depois para o Vasco em 1973.
A final do campeonato Brasileiro de 1974 vencida pelo Vasco por 2x1 com Mario Travaglini de tecnico.


FTT: No Vasco você viu o surgimento do talento do Roberto Dinamite.
TRAVAGLINI: Exatamente. No Vasco fiquei mais tempo, praticamente uns três anos, sendo Campeão Brasileiro em 1974, indo depois para o Sport de Recife.

FTT: Uma grande final contra um time fabuloso que era o Cruzeiro.
TRAVAGLINI: É bom ressaltarmos as dificuldades da época, com 50 clubes, dois turnos e tinha o quadrangular com Santos, Internacional e Cruzeiro. Tínhamos jogado dois turnos com ida e volta, chegando em primeiro. Talvez se fosse em pontos corridos, teríamos sido campeões. No jogo anterior da final, houve um problema com o Vasco, sendo o juiz muito criticado e o jogo era pra ser em Minas Gerais. O regulamento dizia que qualquer problema em campo, o mando de jogo saía invertido para o adversário, sendo transferido no Maracanã. Até hoje se comenta sobre este título, que o Vasco foi favorecido, algumas jogadas na partida, mas muitos se esquecem que chegamos em primeiro lugar com 50 clubes e não 20, como é hoje, ou seja, um campeonato muito difícil.





FTT: Na década de 70 havia uma grande seleção na Europa, que era a Holanda de 1974. Dizem que você teve uma influência do futebol holandês, adaptando ao estilo dos craques do nosso país.
TRAVAGLINI: Eu tenho que fazer uma justiça, porque quando eu já estava no Palmeiras da primeira Academia, o treinador era o falecido Filpo Nuñes, que era muito polêmico, mas uma pessoa maravilhosa, que Deus o tenha  e conhecedor profundo de futebol. Na Academia que foi começada por ele, dizia duas coisas, que deveria ser dado um só toque na bola, o que faz hoje o Barcelona, do qual não dá três toques, mas no máximo dois. Essa questão da Holanda foi importante, pois os jogadores não tinham posição fixa, a movimentação, tornando-se também uma Academia. Quando fui para o Rio de Janeiro, não se falava na época de 3-5-2, 4-3-3 e 4-2-4. Eu parti para 4-4-2, pra haver mais movimentação, pois este sistema permite que todos os jogadores se movimentem. Após a época de Pelé, o volante se tornou, me desculpe a expressão,  um brucutu, porque ele dava o primeiro combate e o zagueiro entrava depois. Eu lembro do Carlos Alberto Pintinho, que trabalhei com ele quando fui Bicampeão Carioca pelo Fluminense em 1976, tratava-se de um volante que se movimentava dentro deste nível.

FTT: Você falou do Carlos Alberto Pintinho, que jogou naquele timaço do Fluminense, sendo talvez o melhor time que você dirigiu, conseguindo ser Bicampeão Carioca em 1976.
TRAVAGLINI: Antes eu havia sido técnico do Sport de Recife. Lá eu ganhei o título do primeiro turno, sendo que houve um problema, porque é difícil ganhar dois turnos. Eu pedi pra sair. Tinha até um diretor, o Roberto Massa, que era tio do piloto Felipe Massa, querendo que eu retornasse à São Paulo. O pessoal do Fluminense me telefonou, pedindo que eu voltasse ao Rio de Janeiro, em vez de ir pra São Paulo. O presidente era o Francisco Horta.

O tecnico Mario Travaglini com o plantel do Fluminense reunido em 1977

FTT: O time do Fluminense nem precisava de tantos esquemas táticos.
TRAVAGLINI: Eu fui premiado com times como esse, Palmeiras e Vasco, pois sempre tive grandes jogadores. O Fluminense tinha na defesa Renato, Carlos Alberto Torres, Miguel, Edinho e Rodrigues Neto. O meio era formado por Carlos Alberto Pintinho, Paulo Cesar Caju, Rivellio e Dirceu. E na frente nada mais que Gil e Doval. Era o 4-4-2. O time era uma máquina. No Palmeiras jogavam Valdir, Djalma Santos, Djalma Dias, Valdemar Carabina, Zequinha, Dudu, Ademir da Guia, Julinho, Servílio, Tupã e Rinaldo. Já quando comecei, tive grandes jogadores e me adaptei fácil. O Vasco embora não fosse tão técnico, era um time de muita garra, com Andrada, Fidélis, Miguel (que depois foi para o Fluminense), Moisés, Alfinete, Alcir, Lê, Zanata, Jorge Carvoeiro e tinha o Luiz Carlos como quarto homem pelo meio. Na frente havia o Dé. Com o tempo, fui ver uma decisão de Juniores entre Flamengo e Vasco, sendo que eu já acompanhava o Roberto Dinamite, pois gostava de ver os jogadores mais novos. No Flamengo jogava o Zico. Vendo o Roberto jogando, quis trazê-lo para os Profissionais. Nessa época tinha o Tostão. Eu lancei o Dinamite ele foi muito bem, sendo que ainda jogaria mais dois anos como Junior. Acabou se tornando titular e foi um grande jogador. Era bem garoto (tinha 18 anos), tendo mais tempo pra jogar nas Divisões de Base. Jogador que buscava a bola e ia pra frente, com o Tostão orientando-o muito, foi longe demais e hoje é o presidente do Vasco da Gama.



Mario Travaglini atualmente


FTT: Depois do Fluminense, você recebeu um convite muito legal como supervisor do técnico Cláudio Coutinho na Copa do Mundo de 1978. Como foi esta função e qual é a sua recordação deste Mundial?
TRAVAGLINI: Tenho uma grande recordação, porque foi uma Copa típica, com o Brasil tendo altos e baixos, foi muito saudável pra mim porque trabalhei com uma pessoa como o Cláudio Coutinho, tratava-se de um ser humano maravilhoso, era do exército, conversávamos muito, enfim, inesquecível. A Seleção teve alguns percalços, abrindo mão de um título que ganharia com justiça. Pude aparecer em uma Copa do Mundo, aprendendo muitas coisas e tendo novos contatos. Passado isso, continuei na CBF (na época era CBD) e fui nomeado pra dirigir as Divisões de Base. Tive mais atenção da imprensa e meu trabalho foi mais valorizado. Ao dirigir as Divisões Sub-20, poderia percorrer todo o Brasil, ver os jogadores  que deveriam ser convocados e me atualizando na safra que iria subir. Evidentemente fiquei muito feliz, disputei o Campeonato Sulamericano, do qual fui Vice-Campeão. Depois participamos do Panamericano de Porto Rico em 1979 e sei que foi o último título que o Brasil ganhou desta competição.

FTT: Jogava o Edson Boaro na lateral-esquerda.
TRAVAGLINI: Exato. Jogava também o Solitinho, que hoje é treinador de goleiros. Jogavam alguns jogadores do Internacional. Era um time coeso. Por coincidência disputei a final contra Cuba e com todo o respeito que tenho por este país, vivia um regime um pouco fechado, com treinadores da Tchecoslováquia e da Rússia, mas tinha um time que chegou à uma decisão, sendo muito valorizado, pois eliminou várias equipes.

FTT: Você sonhava em ser um dia técnico da Seleção Brasileira principal?
TRAVAGLINI: No futebol, como qualquer outra atividade, as pessoas trabalham para um dia virar chefe, pois é algo que faz parte da sequência do seu trabalho. Eu estava sempre pensando mais adiante, não chegando a sonhar com isso, mas as coisas foram se encaixando e acabei sendo muito feliz no que consegui.  Fui, desculpe a minha expressão, abençoado, porque tive a oportunidade de dirigir grandes clubes e jogadores, sempre trabalhando em equipes de primeira linha


FTT: Houve uma passagem pela Portuguesa de Desportos.
TRAVAGLINI: Exato. Antes havia dirigido o Botafogo de Ribeirão de Preto e o XV de Piracicaba. O meu último clube foi o São Bento de Sorocaba, em 1992, quando parei. Fui pra Portuguesa em 1980, que tinha um jogador maravilhoso, que era o Enéas. Ganhamos o primeiro turno, com o Santos ganhando o segundo. Antes de disputarmos, venderam o Enéas uns dias antes para o Bolonha, da Itália. O Santos merecidamente ganhou e ficamos de fora. Eu saí por outras razões e acabei indo para o Corinthians, em 1981.

FTT: Em 1981 você é contratado pelo Sport Club Corinthians Paulista. Sem saber, faria parte de um grande momento da história corintiana e do futebol, que foi a Democracia Corintiana, ao lado de Sócrates, Zenon, Biro-Biro, Wladimir e Casagrande, além do próprio diretor Adílson Monteiro Alves. Você teve muita influência neste movimento tão famoso?
TRAVAGLINI: Quando fui para o Corinthians, a primeira coisa que queria saber Ra sobre o elenco. Haviam 36 jogadores, o que é muito difícil pra se dirigir. O time estava na Taça de Prata, que era a segunda divisão, sendo que a Taça de Ouro era na primeira. Se você subisse, a vantagem era que já se estava no campeonato da Taça de Ouro e foi o que aconteceu com o Corinthians. Eu armei o time, escolhi junto com o Hélio Maffia, reuni a Comissão Técnica e avaliar os jogadores sobre vários aspectos. Nós ficamos praticamente com 18 jogadores. Contratamos o Alfinete e o Daniel González (jogou comigo na Portuguesa) e alguns jogadores dos Juniores. No meu início, o Corinthians havia sido desclassificado do Campeonato Paulista. Começamos outra fase. Fiz uma preleção no elenco, dizendo que eu exercia autoridade, mas não era autoritário, haveria uma certa liberdade, porque jogador, acima de tudo, é o artista, que exibe sua arte dentro do campo, sendo que muitas não se dá esse valor, pois ele joga com as pernas, tendo que se equilibrar, sair fora das pancadas, tendo que estar bem tranquilo. Eu fazia isso em todos os clubes. Quando eu estava no Vasco, o Luiz Carlos e o lateral-direito Cesar se formaram em Direito, estudavam à noite quando não estavam concentrados, sendo que sempre agi de forma democrática e sincera, com os jogadores me compreendendo. Na época das Diretas Já, a própria diretoria do Corinthians apoiava este esquema, com alguns jogadores indo para o palanque. Tornou-se uma democracia com direitos e deveres, tendo que se saber respeitar essas opções. Até hoje é a Democracia Corintiana, que eu me orgulho e tenho prazer de ter participado. Há pouco tempo perguntaram ao Sócrates se eu era uma  
pessoa importante na função. Foi no programa do Cartão Verde que ele participa, respondendo que eu era um gênio na coordenação da equipe. O livro que foi escrito sobre mim é citado da Academia do Palmeiras, onde eu estava estudando, chegando à uma democracia consolidada. A obra por enquanto é sobre São Paulo, mas pretendo mais pela frente, se Deus quiser, lançar um livro pro Rio de Janeiro, baseado nesse outro, já conversei com a editora, pra levar o que eu fiz nesses 12 anos no Rio.


FTT: E o título paulista de 1982? Vocês tinham certeza que ganhariam? Vejo entrevista do Zenon e Wladimir, falando que poderiam jogar tantas vezes com o São Paulo e sempre ganhariam pelo o que o time vinha jogando.
TRAVAGLINI: O time estava bem armado dentro daquela filosofia que te falei. Tratava-se de um carrossel, porque  era difícil marcar o Corinthians. Ajudei a mudar a equipe, pois o time é conhecido por sua raça, vontade e luta, mas a parte técnica tem que prevalecer. O time se movimentava e com toque de bola. Há pouco tempo encontrei com torcedores amigos, falando que eu era o único técnico do Corinthians que fazia eles irem ao jogo sabendo que a equipe não iria perder. Da mesma forma que a Academia forte do Palmeiras, o Corinthians também acabou sendo uma academia, dentro de uma democracia, mas com deveres e direitos.

FTT: Em 1983 você sai do Corinthians pra ser treinador do São Paulo, coincidentemente disputando uma final contra o seu ex-clube, que foi Bicampeão Paulista em cima de um time muito bom.
TRAVAGLINI: Saí do Corinthians amigavelmente, sem ninguém falar mal de alguém. O São Paulo já tinha me convidado anteriormente, quando eu estava no Rio de Janeiro, já tinha acabado de assinar contrato com o Vasco, ou seja, um clube que sempre quis o meu trabalho. Perdemos para o Corinthians, um time muito bom. Fui até elogiado na época. Depois voltei para o Palmeiras e pro Corinthians, do qual cheguei a ser supervisor em 1993.
Mauricio Sabará e Maro Travaglini


FTT: Teve também uma passagem pelo Vitória da Bahia.
TRAVAGLINI: Ganhei o primeiro turno no Sport. Fiz também um grande trabalho no Vitória, sendo Vice-Campeão contra o Bahia.

FTT: Além da gerência do Corinthians, você também foi presidente do Sindicato dos Treinadores.
TRAVAGLINI: Quando saí do Corinthians, eu parei um pouco. As coisas começaram a mudar com a Lei Pelé. Fiz dois mandatos no Sindicato dos Treinadores do Estado de São Paulo, conseguindo fazer algumas coisas, de nos libertarmos do Conselho de Educação Física (com todo o respeito que tenho por ele), pois achava que a lei 8650 que regulamentava a profissão de treinador. que ele deveria ter o diploma de Educação Física, só que o texto era bem claro, dizendo “ser treinador de futebol preferencialmente deverá ter o diploma ou aquele que tenha trabalhado no mínimo 6 meses no clube”. A lei era bem clara, dizendo “preferencialmente” e não “obrigatoriamente”. O conselho batalhou muito e conseguiu tirar essa parte deles, porque eu fui feliz, entrei com o juiz federal, com o Conselho de Educação Física, tentando apaziguar. Quando eu jogava, fazia parte do Sindicato dos Jogadores, batalhando pra regulamentar, sendo inclusive diretor, conseguindo depois quando já era treinador do Vasco, tendo uma festa em São Paulo. Fui um dos fundadores do Sindicato dos Treinadores, batalhei a favor desta classe, dando condições à eles de gerir uma profissão, regulamentando-a. Também fui presidente do Centro Acadêmico Leão XIII por ser formado em Economia pela Universidade Católica de São Paulo, do qual aprendi muito na parte política. Todas as categorias que estive eu lutei pela classe. Estou muito feliz, ainda assisto futebol e procuro ajudar. Essa é a minha história.
REPORTAGEM: Maurício Sabará Markiewicz.
FOTOS: Estela Mendes Ribeiro.

 

 

terça-feira, 7 de junho de 2011

Encontros eternizados - PIAZZA, DOUGLAS & FABINHO


O Cruzeiro fez a alguns anos atrás uma homenagem a seu grande capitão Wilson Piazza. A camisa usada na segunda partida da final da Taça Brasil de 66 contra o Santos foi relançada. Para a festa a diretoria convidou outros dois grandes volantes vitoriosos : Douglas criado no proprio clube e que alem de diversos titulos estaduais venceu o bicampeonato da Supercopa e Fabinho campeão da Copa do Brasil em 96 e da Libertadores em 97 . Tres gerações de volantes reunidas.

Revista do Dia - Placar 1974


A revista Placar de 1974 trás em sua capa os laterais da seleção brasileira: Ze Maria e Marinho Chagas.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

O Craque disse e eu anotei - CECI

O Ceci é um velho conhecido do meu amigo Mário Américo Netto, que tive a oportunidade de entrevistar para o Blog. Ele que fez o intercâmbio. Trata-se (junto com Djalma Santos) do único representante da grande Portuguesa de Desportos da década de 50. Tivemos uma conversa natural, em que ele se lembrava de muitos fatos da Portuguesa e dos outros clubes que atuou, como o Villa Nova e o Cruzeiro, falando com extrema naturalidade. Uma pessoa que guardei um carinho especial, juntamente com as suas simpáticas filhas (Elza e Cida). Confiram a matéria.

FUTEBOL DE TODOS OS TEMPOS: Você começou a jogar no Villa Nova da cidade de Nova Lima, em Minas Gerais, onde nasceu. Este time, na década de 30, era muito bom, pois tinha jogadores como Zezé Procópio, Perácio e Canhoto. Como jogava essa equipe?
CECI: O Zezé Procópio jogava muito, ficava jogando sozinho nos treinos para adquirir mais domínio de bola. Já o Perácio chutava bem forte, em qualquer posição do campo. E o Canhoto também era excelente, cabeceava muito bem. Havia também o Prão e o Alfredo Bernardino que foi jogar no Vasco. O meu padrinho foi o grande zagueiro Chico Preto, que veio do América Mineiro, jogando depois no Villa Nova e Campeão Paulista pelo Corinthians em 1941.
Villa Nova em 1943.
FTT: Em Nova Lima você também jogou no Retiro. Qual dos dois times tinha mais torcida?
CECI: Joguei também no Retiro. O time acabou porque não conseguia ganhar do Villa Nova ou subir. Mas o Villa tinha mais torcida. Na época que comecei a jogar sofri muito pressão do meu pai pra parar, porque jogador de futebol era considerado vagabundo, diferente de hoje que os pais até gostam quando os filhos vão jogar em um grande clube.

FTT: No Villa Nova jogou como atacante de 1941 a 1947. Quais eram os grandes adversários da época? Foi artilheiro no Villa?
CECI: Jogava como meia-direita. Os grandes adversários eram mesmo o Atlético, Cruzeiro e América. Joguei no estádio de Lourdes, Barro Preto e Alameda. Marquei bastante gols pelo Villa Nova. Joguei muito contra o Kafunga e Niginho. Eram craques de bola. Outro que gostava bastante foi o Guará, mas não cheguei a enfrentá-lo.


CECI VAI PARA O CRUZEIRO


FTT: A partir de 1947 você é contratado pelo Cruzeiro na mais cara transação do futebol mineiro. Por sinal você era um jogador bem polivalente, pois jogou como centro-médio, meia-direita e centroavante, jogando bem em todas as funções. Qual é a sua recordação de jogadores como o Paulo Florêncio, Guerino Isoni, Geraldo II, Abelardo (que foi entrevistado pelo Bruno em Belo Horizonte) e Sabu?
CECI: No Cruzeiro jogava também como meia-direita, depois o time começou a precisar de jogadores na defesa, passei a jogar como volante e me adaptei bem à função. O Paulo Florêncio veio do Siderúrgica, foi jogador da Seleção Brasileira e jogava demais, como os outros que você citou.
Jogadores do Cruzeiro preparados para uma viagem nos anos 40.


FTT: E os jogos contra o Atlético?
CECI: Eram bem disputados, mas sem as brigas que tem hoje. Eles tinham um time muito bom, com o Murilo que foi um dos melhores zagueiros que vi jogar. Tinha também o Lucas Miranda, Carlyle, Nívio, Zé do Monte e Lauro. Eram todos excelentes jogadores.

Ceci, Adelino e Didico no Cruzeiro.  Ceci pegou tempos dificeis entre o tricampeonato de 43/44/45 até  voltar a vencer em 56.



Cruzeiro final dos anos 40 - Em pé a partir da esq.Ceci, Adelino, Vicente, Oldack, Geraldo II e Duque . Agachados : Helvecio, Guerino, Nonô, Paulo Florencio e Sabu

FTT: Você jogou na Seleção Mineira. Eram jogos difíceis contra os Paulistas e os Cariocas?
CECI: Eram bem complicados. Os gaúchos e baianos também davam muito trabalho.

A MELHOR FASE DA CARREIRA NA PORTUGUESA

FTT: No início de 1951 você foi contratado pela Portuguesa de Desportos e participou daquele que é considerado o maior time da história do clube.
CECI: O time foi melhorando. Fizemos um bom Campeonato Paulista e ganhamos o Rio-São Paulo no ano seguinte. A equipe jogava com Muca, Nena e Noronha; Djalma Santos, Brandãozinho e Ceci; Julinho, Renato, Nininho, Pinga e Simão.  Oswaldo Brandão era o nosso técnico, o melhor com quem trabalhei. Djalma Santos e Brandãozinho, meus companheiros da linha-média, eram fantásticos. O Julinho Botelho foi o maior ponta-direita que vi jogar.

FTT: Fale sobre aqueles famosos 7 a 3 contra o Corinthians.
CECI: O Julinho fez quatro gols. Se tivéssemos mais 10 minutos, faríamos uns dez gols.

FTT: Comente sobre as excursões da Portuguesa no exterior.
CECI: Na Turquia fui duas vezes. Joguei também contra o Atlético de Madrid, ganhando na casa deles. Nosso time era muito bom. Ganhamos a Taça San Izidro.
Portuguesa x Atlético de Madrid

FTT: Porque você não foi convocado pra Copa do Mundo de 1954?
CECI: Eu quase fui. Acabou indo o Bauer, que era um grande jogador. Fora dos clubes que atuava, só joguei na Seleção Mineira. Nem na Paulista eu fui convocado.

FTT: Em 1955 veio a conquista do segundo Rio-São Paulo, o seu último título pela Portuguesa.
CECI: Foi um título bem importante. Mas o time de 52 era melhor e a primeira conquista marcou mais.
Jogadores da Portuguesa sendo Ceci o primeiro  a esquerda abanando a mão, comemoram o titulo do Rio-Sp de 1952

Ceci na Portuguesa


FTT: Qual foi o jogador que te deu mais trabalho ao longo da sua carreira?
CECI: O Luizinho do Corinthians era bem complicado de marcar, porque driblava demais. Ele jogava muito contra os outros adversários, mas comigo era diferente por causa da minha marcação, pois eu jogava sério e não aceitava brincadeiras, sendo que por ser bem mais forte, conseguia pará-lo com o meu corpo.

FTT: E quem te inspirou mais como jogador?
CECI: Tive mais influência quando passei a jogar na defesa. Quem eu mais gostei foi o Domingos da Guia, o melhor zagueiro que vi. O filho dele (Ademir da Guia) fazia no meio o que ele fazia na defesa.
Ceci em clássico da Portuguesa x Palmeiras.




FTT: Você parou de jogar em 1956. O Pelé fez a sua estréia pelo Santos neste mesmo ano. Nunca se enfrentaram. Se isso acontecesse, como seria a sua marcação?
CECI: Realmente nunca enfrentei o Pelé. Se acontecesse, jogaria do mesmo jeito duro, como fazia contra o Luizinho, que era muito habilidoso.

FTT: Depois de encerrada a carreira na Portuguesa de Desportos foi trabalhar nas Divisões de Base do clube.
CECI: Tomava conta da concentração. Eles tinham confiança em mim, pois passei muitos fundamentos aos novos jogadores. Tenho muito carinho pela Portuguesa, que nunca me atrasou o pagamento, um clube muito correto. O Jair da Costa passou por mim.
Djalma Santos, Brandãozinho e Ceci

FTT: O que você tem a dizer da Portuguesa atualmente? Ainda acompanha o time?
CECI: Antigamente ganhávamos de 5. Hoje, ganhar de 2, é difícil. Atualmente tem jogadores que você nem sabe de onde vieram.

Ceci atualmente com fotos dos tempos de Portuguesa a quem ele tanto dedicou amor.


Mauricio Sabará e Ceci

REPORTAGEM: Maurício Sabará Markiewicz.
FOTOS: Estela Mendes Ribeiro.